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A pauta é única:
cumprir a Constituição
* Por Juliano Breda
A
s manifestações nacionais de insatisfação com
as instituições públicas agigantam-se quase
na mesma proporção das avaliações que bus-
cam entender esse fenômeno singular. O movimen-
to, que se formou inicialmente em torno das tarifas
do transporte público, agregou inúmeras causas e
foi vitorioso no primeiro dos temas. Mas e agora? A
sensação coletiva é de que a mobilização social re-
almente ostenta um invencível poder transformador.
Mas o movimento popular parece, nos últimos dias,
estar tão ou mais indeciso que a classe política. Qual
será o próximo tema a manter engajados milhões de
brasileiros nas ruas? Ficou claro para todos que não
era um movimento apenas pela redução de centavos
na tarifa, mas essa foi a resposta dos governantes,
recuando no aumento do transporte. Pauta concreta
e objetiva, clara e definida, incontestavelmente vito-
riosa.
Saúde, educação, segurança pública e combate à cor-
rupção constituem-se nas bandeiras mais importan-
tes e visíveis de todas as manifestações, de norte a
sul, independentemente de tendências (a)partidárias
e ideologias, mas elas, lembro Paulo Leminski, não
podem ser resolvidas por decreto, como a redução
do preço das tarifas. Trata-se de um processo len-
to, gradual e descontínuo, com avanços e retroces-
sos, derrotas e conquistas, fruto do amadurecimento
democrático de uma nação. Durante muito tempo, o
povo acreditou que seus direitos sociais, políticos e
econômicos seriam respeitados, assegurados de for-
ma plena pelo Estado, que o exercício do poder se-
ria pautado pela legalidade, austeridade, eficiência
Juliano Breda, presidente
da OAB/PR
Divulgação
e impessoalidade, que seus representantes políticos
cumpririam os mandatos populares administrando a
máquina pública exclusivamente em nome do inte-
resse coletivo. A Constituição Federal de 1988 com-
pletará 25 anos. Um abismo entre texto e realidade.
O artigo 5º, que estabelece os direitos fundamentais
do cidadão, reduziu-se nesses dias à liberdade de
expressão e ao direito de associação para que o povo
pedisse uma sociedade justa, livre e soli-
dária, sem preconceitos, que estimule uma
economia com a finalidade de erradicar a
pobreza e reduzir as injustiças sociais.
Não construiremos um futuro digno sem
escolas e hospitais de qualidade, mas não
daremos um passo rumo ao futuro que que-
remos com violência, fanatismos e intole-
rância. O pluralismo político, mesmo com
a desesperança nas estruturas partidárias,
é um dos fundamentos republicanos, uma
conquista histórica da redemocratização
de nosso país. Por isso, acredito que toda
a transformação deve-se operar a partir
dos marcos do Estado de Direito. Coquetel
molotov, saques, paus e pedras, por mais
justas que sejam as causas, não são ins-
trumentos de legítima mudança em uma
sociedade democrática: o caos é o convite
à truculência, ao autoritarismo e à desmo-
ralização das reivindicações.
Estão cobrando uma pauta objetiva aos
movimentos populares. Não há necessida-
de, pois a pauta é bem simples: a socie-
dade exige um novo modelo de exercício
do poder, em obediência fiel ao interesse
público. Como fazer isso? A resposta cabe aos que
foram eleitos para cumprir a Constituição. O Povo
brasileiro já fez sua parte.