Edson Vidal

Aumento ou Reposição Salarial?

Meu primo João Carlos, me telefonou ontem pela manhã externando toda a sua indignação com o aumento concedido à Magistratura em razão do estrondoso efeito “cascata” que ele proporcionará para todo o funcionalismo público do país.

Disse que vai desfraldar bandeiras para coibir tamanha barbaridade e falta de patriotismo. E sabendo que sou Magistrado me provocou para escrever sobre o tema e por que diz respeito ao meu próprio interesse e bolso. Primo é primo. Sei que na atual conjuntura econômica e as diferenças existentes entre subsídios, vencimentos, salários e soldos é temerário discorrer sobre o tema, sob pena de ser publicamente tripudiado.

Assim não será fácil explicar referida reposição salarial comparando com o ganho sabidamente insuficiente dos professores do ensino fundamental. No entanto vou registrar meu ponto de vista, sem fugir da verdade, como sempre tenho feito em toda minha vida. Inicialmente tentarei historiar como surgiu o problema. Antes de o Ministro Nelson Jobim assumir a presidência do STF, não se cogitava em estabelecer teto único para a Magistratura; assim, os juízes Federais e Estaduais tinham reposições salariais anualmente, atrelados à arrecadação dos respectivos erários públicos.

A isonomia salarial  dizia respeito apenas entre Magistrados e Membros do Ministério Público, por serem carreiras assemelhadas e frutos de uma mesma árvore. Nem se cogitava até então no chamado “efeito cascata”. O Min. Jobim que ao ser nomeado para o STF tinha o menor salário entre seus demais pares, porque não tinha o benefício do chamado Adicional por Tempo de Serviço (ATF) para somar ao seu vencimento básico, resolveu na condição de Presidente do famigerado e inconstitucional Conselho Nacional de Justiça (CNJ) igualar o vencimento de todos os Ministros daquela Corte Superior e carreiras da Magistratura do país.

Entabulou uma fórmula de fixar um só “subsídio” (não mais vencimento) correspondendo a um mesmo valor para toda a Magistratura brasileira. Via de consequência o Adicional de Tempo de Serviço (ATF), que correspondia a cinco por cento do valor do vencimento como acréscimo no salário básico, para cada cinco anos trabalhado, foi sumariamente subtraído daqueles que tinham este direito.

E os subsídios valorados serviram como teto para toda a Magistratura, daí então, os valores foram escalonados em percentual decrescente na carreira até chegar ao valor pago ao Juiz Substituto, início de carreira. Tudo  por existir degraus na carreira, denominados de “entrâncias” e “instâncias”, servindo para diferenciar minimamente os ganhos entre os Magistrados. Tratamento isonômico aplicável com igual regra aos agentes do MP.

Dos valores do subsídio de Ministro do STF e dos Desembargadores dos Tribunais de Justiça foi criado o chamado “teto constitucional” para impedir que funcionários públicos das demais carreiras da administração pública federal e estadual pudessem ultrapassar o ganho de referidas autoridades, surgindo, como consequência, perigoso gatilho.

E para não sofrerem críticas os “funcionários de carreira” da classe política (Presidente da República, senadores, governadores, deputados federais e Estaduais, prefeitos e vereadores), sem nenhum escrúpulo se sujeitaram ao novo “teto”.

E assim agiram porque são caras de pau, vez que seus “subsídios” sabidamente são acrescidos de benefícios artificiosos que se perdem no imaginário do povo. Desta classe cabe excepcionar apenas o Presidente, os governadores e prefeitos. Em paralelo as demais carreiras públicas mantiveram a denominada verba do “Acréscimo por tempo de serviço”.

Na soma de algumas delas o valor mensal do vencimento superou aos subsídios estipulados (para Ministros e Desembargadores)  valendo estes então como “redutores de salários”. Sem contar que muitas carreiras foram aquinhoadas com igual remuneração por terem sido reconhecidas politicamente como assemelhadas a Magistratura. Claro que recompondo o ganho dos subsídios dos Ministros do STF gera o efeito “cascata”.

O dique da retenção que serve de “redutor” vai se romper. Sem levar em conta que o Judiciário e o MP para melhor aquinhoar o ganho dos que estão na Ativa criaram benefícios paralelos (o principal deles o auxílio moradia) que não foi incorporado ao subsídio, tudo para suprir as perdas decorrentes da inflação e na remuneração básica, a fim de atrair e/ou evitar a evasão de talentosos juristas para a carreira. A verdade. 

Há mais de seis anos os subsídios estão engessados  no mesmo valor. E as cifras anunciadas como “aumento” de dezesseis por cento corresponde a título de reposição desse período, cujo numerário anunciado refere-se ao valor bruto do futuro subsídio, sem as deduções obrigatórias retidas na fonte pagadora a título de imposto de Renda e Previdência (que somados correspondem a trinta e cinco por cento do valor bruto).

Evidente que “salários”  achatados pelo “teto” vão desaguar no comprometimento do  erário público federal e estadual. Em razão da trama odiosa criada pelo CNJ e que interessa aos governos; resta como alternativa desindexar o subsídio da Magistratura com os vencimentos das demais carreiras para que cada qual caminhe de acordo com seus próprios orçamentos.

No entanto é  estranhável que a notícia dessa reposição salarial seja quase considerada como ato criminoso de lesa a Pátria, quando não, de outro viés, ninguém se importa com os ganhos dos diretores e funcionários das estatais, diretores comissionados dos bancos públicos, os penduricalhos que incidem além do “teto” salarial fixado para os três poderes, que beneficiam os que ainda estão na ativa, bem como, os ganhos escandalosos dos senadores e deputados.

Sem falar dos salários milionários dos ungidos que mamam nas tetas da Itaipu, uma empresa que tem o status igual ao do Vaticano, pois sequer suas contas e remunerações são fiscalizadas pelo Tribunal de Contas da União, a pretexto de se tratar de empresa binacional.

Enfim, é óbvio que o modelo de subsídios como está, não pode continuar. Mas não é justo que o aumento da Magistratura cause tanta indignação e raiva. Esta é a verdade. Com um esclarecimento oportuno: todos os Desembargadores aposentado dos Tribunais ganham mensalmente menos (subsídio líquido) do que um Juiz Substituto que está dando os primeiros passos na carreira. Pode? Cada um tire a conclusão que quiser...

“Nós ares de um novo Brasil tudo tem que ser revisto na Administração Pública. A verdade tem que ser mostrada, os excessos aparados e os privilégios banidos. Sem perder de vistas o valor e a importância das respectivas carreiras públicas!”
Edson Vidal Pinto

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