COVID-19 e crime

“É inconcebível que um cidadão, sabendo que foi testado positivo para o COVID-10, desobedeça às orientações médicas e as medidas de saúde pública e propague esse vírus de forma totalmente irresponsável”. Ainda que narrem uma bizarrice, essas palavras realmente foram ditas por Paulo Carvalho, procurador-geral da Bahia, em relação à conduta de um empresário que teria viajado em jato particular com amigos de São Paulo à Bahia sabendo que portava o coronavírus.

Se for verdade, será que esse sujeito cometeu crime? Segundo a Portaria Interministerial n. 5/2020, sim, mas qual crime? Trata-se de um delito raro no cotidiano dos brasileiros, chamado de infração de medida sanitária preventiva, previsto no art. 268 do Código Penal. Esse crime ocorre quando uma pessoa infringe determinação do poder público destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa, como a COVID-19, mesmo que não infecte terceiros.

Para se punir qualquer pessoa que venha a agir como o empresário teria agido, deve existir norma que restrinja a liberdade com o objetivo de evitar a propagação da COVID-19, o que é realidade no Brasil por conta da citada Portaria Interministerial. 

A pena pela prática desse crime, por outro lado, não é alta, pois a punição é detenção, de 1 mês a 1 ano, e multa. Porém, se afetar a saúde de alguém, a pena pode ser aumentada até a metade. Se outros morrerem por um comportamento como esse, a punição é dobrada, isso se não configurar crimes mais graves.

O pior é que não é só esse crime que se vê no dia-a-dia durante a crise do coronavírus. Afinal, quem anuncia cura da COVID-19 por meio secreto ou infalível que sabe ser ineficaz pratica o delito de charlatanismo, enquanto aqueles que, sem respaldo científico, estão habitualmente diagnosticando a COVID-19, ou aplicando tratamentos atípicos contra a doença, seja por meio de substâncias ou de gestos e palavras, comete crime de curandeirismo, ressalvadas as pessoas que o fazem dentro de práticas religiosas.

O fato é que essas situações aumentam ainda mais o nível de atenção que deve ser direcionado à COVID-19, cujos efeitos vão além da doença e da Economia, a ponto de desencadear a prática de crimes. 

Por Lincoln Domingues, advogado especializado na área Penal Empresarial e professor do Observatório de Jurisprudência Criminal na FAE Centro Universitário, em Curitiba - PR