Liberdade econômica e direitos humanos: uma união mais do que necessária
O mundo assistiu perplexo, no dia 25 de maio, ao assassinato cruel de George Floyd durante uma abordagem policial bastante controversa na cidade de Minneapolis, no estado de Minnesota, Estado Unidos. O policial Derek Chauvin, em serviço na mesma cidade, ajoelhou-se no pescoço de Floyd por quase sete minutos, enquanto ele estava deitado de bruços no chão. Desde então diversos protestos foram organizados por todo o país, em resposta ao acontecimento.
Esses protestos levantaram pautas importantes como: abuso de autoridade, papel do estado, situação das populações marginalizadas e racismo estrutural e, nem é preciso dizer, que diversas análises do acontecimento foram veiculadas na mídia e no meio acadêmico. De alguma forma, a maioria de nós procura uma maneira de acabar e impedir que acontecimentos lamentáveis como esse ocorram novamente. Afinal, estão no cerne dos valores da sociedade ocidental livre e democrática a criação e a manutenção de um espaço onde cada ser humano tenha o seu valor e sua individualidade reconhecidos e respeitados.
No entanto, apesar da maioria de nós procurarmos soluções para esses problemas, por algum motivo esquecemos que situações como a vivida por George Floyd se tratam em última análise de uma grosseira violação dos direitos humanos. Violação essa que ocorre em parte por nossa própria dificuldade em criar instituições mais inclusivas, e em parte pela falta de liberdade e de recursos econômicos para levarmos adiante a construção de uma sociedade mais próspera.
Os constituintes brasileiros foram muito generosos ao colocar no texto da Constituição Federal de 1988, diversos dispositivos de proteção aos direitos humanos, dentre os quais se destacam: os direitos sociais, a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, e também a assistência aos desamparados. É importante notar que ninguém discute se tratarem de elementos de primeira grandeza, sendo todos fundamentais para o pleno desenvolvimento das potencialidades humanas, mas antes de consagrá-los como direitos humanos no texto constitucional, o constituinte deveria ter se preocupado em apontar quem e como se pagará por eles.Sabemos que a principal fonte de receita do Estado é a tributação. Desse modo, para que a garantia dos direitos humanos seja efetiva - do ponto de vista estatal - é preciso tributar, centralizar e planejar mais. Seria um plano perfeito, se não tivesse se mostrado tão ineficaz e perverso nos últimos anos.
Quando o Estado tributa mais - direta ou indiretamente - ele onera toda a cadeia produtiva e de consumo da economia, de forma que afeta todos os cidadãos e prejudica justamente os mais necessitados, que passam a desfrutar de menos postos de trabalhos e de opções de consumo cada vez menores, a medida que o Estado tenta reverter parte da arrecadação para salvaguardar a aplicabilidade dos serviços sociais mínimos.
Além do peso monetário de uma estrutura estatal que visa supostamente assegurar direitos, existe ainda o risco de captura da máquina pública pelos mais diversos agentes políticos, que ao final acabam por trabalharem em benefício de apenas alguns grupos mais chegados e tentarão a todo custo consolidar o seu poder político. Nesse cenário, uma elite acaba sendo formada e pessoas como George Floyd passam a não ter chance alguma contra o estamento político-cultural.
Nesse sentido, quando falamos em liberdade econômica necessariamente nos referimos a um cenário de liberdade e de emancipação política, econômica e social, onde o tamanho do governo e os seus gastos sejam reduzidos ao mínimo possível, a moeda seja sólida, a inflação controlada, sejam abolidos todos os limites e taxas ao comércio internacional, a regulação seja sempre no sentido de proteger a livre concorrência e, finalmente, onde o Estado sirva como garantidor absoluto do direito de propriedade, tendo como premissa que a propriedade de si próprio é o primeiro e mais sagrado direito de propriedade, dos quais derivam todos os demais. Nesse cenário, a escravidão, objetificação do ser humano e o elitismo não terão espaço.
Pode parecer contraditório, que diminuir o tamanho do Estado e promover medidas liberalizantes sejam ações eficazes para proteger os direitos humanos, mas ao cruzarmos os números do ranking "Liberdade no Mundo" (Freedom in the World) elaborado pela Freedom House, que consideram o sistema de proteção das liberdades civis e políticas, e o ranking de Liberdade Econômica elaborado pelo Instituto Fraser, trazido ao Brasil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e que agrupa variáveis como tamanho do estado, estabilidade monetária, regulação e liberdade comercial e internacional, percebemos que dos 20 países com melhor colocação, no que diz respeito aos direitos humanos, mais da metade deles estão também entre as 20 economias mais livres do mundo. Países como Nova Zelândia, Finlândia, Holanda, Reino Unido, Luxemburgo, Suécia, Noruega, Dinamarca, Austrália, Irlanda, Suíça e Japão são campeões em liberdade econômica e, também, dos direitos humanos.
É interessante observar que, em países onde há precária proteção aos direitos humanos, quase sempre também há baixíssimos níveis de liberdade econômica. Países como Arábia Saudita, China, Coreia do Norte, Líbia, Síria, Sudão e Venezuela representam bem os países com as piores colocações em ambos os rankings.
É evidente que mais estudos precisam ser feitos, para que se possa averiguar com precisão a existência de correlação e causalidade entre os dados de ambos os rankings. No entanto, um olhar despretensioso aos números nos faz lembrar do que há muito escreveu o ganhador do Prêmio Nobel de Economia, Friederich Hayek, quando disse que ao controlar essa economia, o Estado estaria controlando o meio pelo qual o indivíduo recorre para atingir seus objetivos. Desse modo, a liberdade do indivíduo para alcançar seus desejos estaria em parte subordinada ao Estado e, consequentemente, a liberdade individual da sociedade é reduzida como um todo, criando um ambiente propício a violações, tal qual a sofrida pelo americano George Floyd.
Por Allan Augusto Gallo Antonio, formado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e mestrando em Economia e Mercados pela mesma instituição. É pesquisador do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica