As implicações trabalhistas da retomada das atividades no “novo normal”
Do dia para a noite, a necessidade de isolamento social causada pela pandemia do novo coronavírus obrigou as empresas a fecharem suas portas, gerando um esvaziamento de escritórios e prédios comerciais.
Contudo, com a flexibilização dos Decretos Estaduais e Municipais, algumas companhias já estão retomando as suas atividades presenciais. Além das recomendações de saúde, a reabertura também vai implicar em impactos legais para as empresas. Nesse sentido, questiona-se quais medidas as corporações devem adotar no retorno de suas atividades sem colocar em risco a vida dos seus colaboradores, ao mesmo tempo em que cumprem sua responsabilidade social de não propagação do vírus.
Primeiramente, importa mencionar que o Supremo Tribunal Federal (STF) abriu a possibilidade do reconhecimento da COVID-19 como doença ocupacional, caso comprovado o nexo causal. Em decorrência disso, as empresas precisam estar alertas às medidas, tanto para prevenir o contágio, como para evitar que sejam responsabilizadas caso algum empregado contraia o vírus, inclusive por acidente de trajeto.
O STF reconheceu que os Estados e Municípios possuem competência para legislar sobre medidas de saúde pública e determinar quais as atividades podem ou não retornar, portanto, cabe as empresas consultarem os Decretos Estaduais e Municipais que são aplicados a seu tipo de estabelecimento e se há autorização para funcionamento.
As companhias deverão observar com rigor as normas de segurança e saúde do trabalho, tais como o acompanhamento de colaboradores do grupo de risco, a realização de exames médicos de retorno ao trabalho, o incremento de profissionais do SESMT (Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho) e a adoção de medidas internas de distanciamento social.
Estas medidas visam atender eventuais fiscalizações dos sindicatos e dos auditores fiscais, bem como reduzir o risco de denúncias dos colaboradores, evitando-se estabelecer o nexo de causalidade entre a aquisição da síndrome respiratória aguda grave causada pela COVID-19 e as atividades desempenhadas pelo empregado na empresa perante as novas condições de trabalho recomendadas pela legislação.
Foi editada em 18/06/2020 a Portaria Conjunta nº 20 do Ministério da Economia e Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, que estabeleceu medidas a serem observadas visando à prevenção, controle e mitigação dos riscos de transmissão da COVID-19 para os ambientes de trabalho em geral. Referida portaria consolida os protocolos a serem seguidos pelas empresas, tais como etiqueta respiratória, higienização das mãos, distanciamento social dos postos de trabalho, implantação de canais de comunicação, monitoramento de empregados do grupo de risco, triagem na entrada dos estabelecimentos, fornecimento de máscaras aos empregados (EPI obrigatório), além de regras para refeitórios, vestiários e transporte de empregados.
Do ponto de vista de custo da folha de pagamento, as empresas que anteciparam férias sofrerão impacto do pagamento do acréscimo de 1/3 sobre as férias, que pode ser efetuado até dezembro de 2020, acumulando-se com os pagamentos habituais de décimo terceiro no mesmo período. Dependendo dos indicadores inseridos nos Programas de PLR e bônus, pode haver a necessidade de renegociação, inclusive com a participação dos Sindicatos, para viabilizar o cumprimento dos acordos ou legitimar alterações necessárias nos instrumentos que normatizam estes itens da remuneração.
Outro ponto que merece atenção nesse momento de retomada são as questões relacionadas à administração de pessoal, como aumento do absenteísmo, com faltas justificadas e suspensões do contrato de trabalho (não apenas as patologias relacionadas a síndrome respiratórias, como também a danos psíquicos), gestão dos períodos de férias para as empresas que anteciparam a concessão do descanso, gestão da estabilidade provisória para as empresas que reduziram a jornada de trabalho e salários ou aplicaram a suspensão dos contratos de trabalho.
Vale lembrar que, desde o início da pandemia, houve um acréscimo de demandas judiciais trabalhistas em relação ao mesmo período do ano passado, segundo apurou o Tribunal Superior do Trabalho (TST), por meio da Coordenadoria de Estatística, que identificou mais de 7 mil ações relacionados à COVID-19. O aumento dos casos, serve de alerta as empresas nesse período. Destaca-se ainda que houve recomendação do TST aos tribunais estaduais para priorização no atendimento das reclamações trabalhistas que retratam temas relacionados à COVID-19, bem como a solução das reclamações em fase de execução. Finalmente, é de suma importância que a empresa mantenha o sigilo das informações médicas dos colaboradores, nos termos da Lei Geral de Proteção de Dados nº 13.709/2014 (LGPD).
Em tempos de grandes transformações, as companhias têm que se adaptar ao “novo normal”, ao mesmo tempo em que cuidam de seus negócios e de suas pessoas, que são seu maior ativo.
Por Wellington Ferreira, advogado