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Singularidade jurídica
A
o iniciar seus esforços para a carreira, o profssional do Direito deve estar pronto
para lidar com situações cotidianas cujo trato será de fácil solução, porém, os ver-
dadeiros desafos virão de situações e fatos jamais imaginados.
Todas as teorias sobre o direito, seja considerando como ciência, seja como arte, seja como
componente singular e imanente da condição humana, irão reconhecer seu dinamismo por
acompanhar amovimentação social, seja ela temporal cronológica ou substancial no tocan-
te à prevalência de determinadas ideologias, conceitos e valores. É por isso que o profssio-
nal do direito deve estar pronto para lidar commúltiplos desafos que aparecerão.
Casais separados em confito procurando alinhavar sua nova condição, vítimas de aciden-
tes buscando a compensação de seus danos que podem ser meramente econômicos ou
personalíssimo que tenham atingido diretamente o corpo da pessoa. Verbas trabalhistas
que não foram pagas e muitos outros são exemplos de situações comuns.
Emergem, a partir de suas lutas uma jurisprudência, pouco comum, com um certo caráter
de ineditismo, por exemplo, quando o contrato de experiência na relação trabalhista é
afastado para garantir a uma empregada a estabilidade decorrente de gravidez. Quando
o vínculo de emprego é afastado para o mutirante que labora em obra de construção de
moradias populares em regime de mutirão. Nestes casos, os profssionais do direito po-
dem se orgulhar de ter trabalhado na construção do resultado, sendo eles: o advogado
que provocou o judiciário, o juiz que proferiu a decisão, o tribunal que a confrmou ou mo-
difcou e até as partes ex-adversas que, mesmo vencidas, batalharam de forma honrosa
pela evolução do direito.
Em nenhum caso ocorre maior alegria ao profssional do direito do que ver o afastamen-
to de uma injustiça. Exemplo comum nas periferias e alglomerados é um jovem ser preso
pelo crime de roubo. Este mesmo jovem quando solto carrega a fama que lhe sobrevém
e pode motivar um aumento nas abordagens de policiais para com a sua pessoa.
Em um caso concreto, após denunciados os policiais pelo excesso de abordagens imoti-
vadas a um profssional do serviço de acompanhamento de egressos do sistema prisio-
nal, um jovem foi preso acusado de tráfco de drogas, processado e condenado.
Seus familiares conseguiram que aquele profssional do serviço de egressos e que ouviu
as queixas elaborasse o documento comprovando que havia escutado a reclamação an-
tes do fagrante. Tudo para demonstrar que o mesmo fora forjado.
Atuar em um processo assim deixa na alma do profssional uma dúvida angustiante, prin-
cipalmente, quando prossegue vendo suas teses serem rejeitadas sumariamente por ter
o réu antecedentes. Será que aquele fagrante de drogas era real ou foi forjado como de-
clara o jovem e seus familiares?
Passado o tempo de prisão, após a condenação, o jovem chega ao momento de ser bene-
fciado com uma progressão de regime, o que lhe permitirá um grau maior de liberdade
do que aquela que tem quando em regime fechado.
O profssional do direito que já amargava a dúvida angustiante sobre a condenação se vê,
mais uma vez, frente a frente a uma questão singular: o processo de execução do jovem,
onde o juiz poderia apreciar e conceder a progressão de regime foi extraviado. Sumiu.
Nova batalha se inicia. Agora, não para eliminar a injustiça que vem imperando desde o iní-
cio, mas tão somente para minimizar sua ferocidade que se apresenta no caso concreto.
Depois de algumas difculdades em um habeas corpus onde a referência ao caso como
singularidade, imbróglio jurídico e outras são muito presentes, o jovem recebe o benefí-
cio próprio da execução penal. Agora, aos poucos, as coisas vão se ajustar para o jovem. E
o profssional do direito deve se concentrar e se preparar pois novo desafo distinto há de
chegar e mais uma vez toda sua estrutura humana, psicoemocional irá se mobilizar para
a solução de um problema singular jurídico.
* Wagner Dias Ferreira, advogado e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MG
Por Wagner Dias Ferreira