O vento nosso de cada dia
Até o tempo ficou meio esquisito nestes tempos lúgubres do Covid-19, não que não tenha céu azul e as vezes repleto de nuvens, mas porque tem um vento muito, muito estranho. São golfadas de ar que uivam sem parar como lobo solitário e que de repente o lamento toma forma do coro de uma alcateia, que até chega a assustar.
Quem mora em prédio de apartamentos sabe muito bem o que estou dizendo ou quem assistiu o clássico do cinema “O Morro dos Ventos Uivantes”. Dias atrás o vento se transmudou em tornado e passou a cem quilômetros por hora por nossa cidade, deixando para trás rastro de destruição com consequentes prejuízos.
A Copel trabalhou dias para recuperar a energia elétrica. Mas o vento continua empurrando nuvens para um lado e trazendo muitas outras numa dança sem parar. Entre um intervalo aparece o sol e logo é encoberto por novelos de algodões claros e outros escuros, propiciando chuva que logo se transforma em densa cortina de chuvisco. Vem a noite e com ela a temperatura vai caindo e o vento ficando gelado. Que vento é este, Eolo?
- Pois é, estou lançando uma nova coleção de ventos para o Século XXI. - me respondeu o deus do vento da mitologia grega. - Achei que deveria apresentar aos curitibanos um vento diferente que pudesse acompanhar a pandemia ...
- Não brinque! - contestei com veemência.
- Não, não estou brincando.
O virus chinês veio mostrar a cara de um novo mundo, onde tudo será diferente. A começar pelo tempo!
- Como?
- Porque a humanidade tem que acordar para uma realidade: o planeta está doente e os humanos perderam de vistas a realidade.
- Realidade?
- Sim, meu caro, o respeito a vida, aos mais próximos, do senso de solidariedade e de respeito. Ninguém mais tem freio inibitório, cada um acha que pode fazer tudo sem dar satisfação para ninguém ...
- ?
- A licenciosidade está imperando, o desamor, a corrupção e a anarquia. Veja, o vírus é fruto da ignorância e do descaso ao meio ambiente. Ou não é?
- Pode ser ...
- O meu vento, também. Eles são reflexos do desmatamento, ou você acha que não?
- Talvez ...
- Pois eu só acelero sua marcha com gestos de minhas mãos, por isto eu sou deus!
- Certo, não duvido disto, mas porque tanto castigo: pernilongos da dengue; seca; Coronavírus e tornados?
- Eu já respondi. - disse o Eolo.
- Castigo?
- Você que está dizendo ...
- Mas como vamos melhorar? As sociedades estão em ebulição, existe uma divisão ideológica, muito ódio, beligerância e maldade!!
- Vocês marcharam unidos para chegar até onde chegaram, não é mesmo?
- Si .. Sim ...
- Pois agora resolvam como sair dessa encruzilhada.
- Eu não sei e não tenho a menor ideia. Nem consigo pensar! - tentei me expressar timidamente. - O senhor pode pelo menos dar uma “dica” para deixarmos este cenário trágico para trás ?
- Claro ...
- Diga então, por favor.
- Comece dando o primeiro passo.
- Como?
- O primeiro passo -, pois os demais sempre serão mais fáceis!...
“Chegamos aonde chegamos porque os seres humanos esqueceram das regras de conduta, obediência e prudência. Foram tantos desencontros de ideias, utopias, vaidades e beligerância que o mundo ficou pequeno demais para tantos desmandos. E agora precisamos dar o primeiro passo para sairmos de nossas indiferenças. Alguém pode dizer: qual é o primeiro passo que precisamos dar?”
Edson Vidal Pinto