Edson Vidal

Credo, parece, mas não é água!

Essa é muito boa e aconteceu na manhã de ontem em uma cidade maravilhosa chamada Curitiba. Todos os seus habitantes são testemunhas que a água potável está sumindo dos reservatórios naturais, porque a estiagem prolongada de há muito se faz presente na região. Fico apreensivo porque da varanda de meu apartamento eu avisto o Parque Barigui e cada dia que passa constato que diminui o volume de água do seu rio Barigui. Acho que as capivaras para mergulhar têm que pedir licença para as demais não fazerem o mesmo, a fim de evitar congestionamento. 

E os peixes com certeza devem estar disputando espaços para poderem nadar. Tal é o drama gerado pela falta de água naquele logradouro público. E o mesmo já está ocorrendo nas caixa de águas de casas e apartamentos com o racionamento imposto pela Sanepar, onde o banho nosso de cada dia está sendo cronometrado e cada pingo desperdiçado compromete a higiene do vizinho mais próximo.


Não lembro de um inverno Curitibano tão seco, de ar desértico pois faz frio de noite e calor de dia, faltando apenas ver miragens no lusco fusco com caravanas de beduínos nômades desfilando pelas ruas, com seus camelos fedorentos. E pensar que muitas crianças nascidas nestes últimos tempos ainda não viram a chuva cair. E a propósito tem pessoas que de tanto conviverem com dias ensolarados que até esqueceram o que é chover.

Vou contar uma cena que testemunhei e que demonstra quão frágil é a mente humana que faz com que muitos indivíduos saiam da realidade. Eu tenho uma amigo chamado Simplicio Alcântara que sofre de amnésia temporária, leva uma vida normal porém tem surtos de esquecimento. Dizem que quando ele era bebê a sua babá por descuido derrubou ele do colo, tendo então caído no chão e batido a cabeça. 

E daí então os seus esquecimento.  Por coincidência ontem pela manhã eu o encontrei na calçada sob a chuva que caía, com uma caneca na mão, tentando com a mesma “apanhar” os pingos d’água que caiam das nuvens.

- Oi, Alcântara, o que você está fazendo na chuva? - perguntei.

- Oi, meu amigo, estou enchendo a caneca com um líquido que parece igualzinho água! - respondeu surpreso.

- Mas é água, água da chuva...

- E a chuva é feita de água?

- Claro, milhões de gotículas que caem das nuvens.

- Putz, não lembro de ter visto algo igual. - falou como se tivesse descoberto alguma novidade.

Foi daí que lembrei da sua amnésia e contemporizei:

- É que faz dia que não chove e vocês esqueceu da água da chuva.

Ele ficou admirado olhando a água dentro da caneca e eu achei que ele estava duvidando do que eu falei.

Daí ficamos   quietos.  O Alcântara permaneceu na recolhendo a água da chuva e eu me afastei do local, com medo de ficar doente. Cheguei em casa condoído com a situação daquele meu amigo que não se lembrava mais da chuva. Culpa da estiagem e de ninguém mais. 

Olhei pela janela e vi o Alcântara, molhado da cabeça até aos pés, com ar pensativo. Eu daria tudo para saber o que ele estava pensando. Fechei a janela. E lá na chuva o Alcântara pensava com seus botões: “Cabra safado este meu amigo por tentar me convencer que o está caindo lá do alto é água da nuvem. Bobagem .

Nuvem uma ova. Água é água e tem cheiro e gosto de cloro; o líquido da chuva não é água. Ela mais parece gotas de lágrimas que vem do Alto; com certeza dos olhos do Criador,  por ver na terra os seus filhos desolados e descrentes nestes momentos de pandemia!”...

“Jamais se deve perder a serenidade mesmo quando a incerteza estiver no ar. E muito menos o jeito de enxergar a vida. Pingos de chuva podem ser gotas de lágrimas. É questão de como querer encarar com otimismo uma situação.”

Edson Vidal Pinto

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