Episódio Sem Malícia
Vivenciei no ofício público dos catorzes até os setenta anos de idade período em que vi, ouvi e protagonizei muitas situações inusitadas. Às vezes acho que sou um arquivo vivo dos acontecimentos e das passagens nem sempre dignas de alguns personagens que passaram e outros que ainda estão na vida pública. Tantos agentes públicos nem sempre de bons propósitos como de políticos que nunca valeram um único vintém. Vivenciei no ofício público dos catorzes até os setenta anos de idade período em que vi, ouvi e protagonizei muitas situações inusitadas. Às vezes acho que sou um arquivo vivo dos acontecimentos e das passagens nem sempre dignas de alguns personagens que passaram e outros que ainda estão na vida pública. Tantos agentes públicos nem sempre de bons propósitos como de políticos que nunca valeram um único vintém.
Em 1.985 assumiu o governo do estado o Álvaro Dias que convidou o então Procurador de Justiça dr. Antônio Lopes de Noronha para ser Secretário de Estado da Segurança Pública, que por sua vez me convidou para ser seu substituto legal. E assim tomei posse como Diretor-Geral da referida Secretaria.
Éramos então colegas no Ministério Público onde o Noronha se destacava pela sua inteligência e profundo conhecimento das lides administrativas. Com ele aprendi a desvendar os meandros da Administração e não cair nas armadilhas que certos cargos de relevância se prestam para seduzir ocupantes incautos e sequiosos de tirar vantagens do dinheiro público. E assim por quase quatro anos seguidos dividimos as responsabilidades no gerenciamento de uma Pasta governamental das mais difíceis de serem administradas.
E logo nos primeiros meses ele me delegou toda a gestão financeira do setor quando me tornei responsável pela destinação das verbas às Instituições Policiais. O país atravessava a pior inflação de sua história e o dinheiro diminuía de valor de uma hora para outra para a alegria dos especuladores que depositavam nos bancos grandes quantias no final do dia e ganhavam polpudos rendimentos na manhã do dia seguinte. Era uma ciranda que só crescia para quem tinha dinheiro e empobrecia os menos afortunados. Essa era a inflação com seus prós e contras.
O orçamento da Secretaria continha números expressivos e por mês a Secretaria da Fazenda repassava verbas milionários que mal dava para passar o mês, exigindo que eu tivesse rigoroso controle nos gastos para evitar as paralisações das atividades policiais. Lembrando que nestas além das Polícias Civil e Militar estavam incluídas as polícias rodoviárias, florestal, Corpo de Bombeiros e os animais de montaria e cães treinados para combater o crime. Mesmo com tantas despesas necessárias eu consegui economizar mensalmente algum dinheiro que era aplicado e, assim, ao longo de um ano e meio o Secretário constatou que daria para comprar 390 viaturas policiais. Mas como? Se fosse através do regular processo de Licitação levaria pela burocracia da Lei alguns meses e reduziria o número de carros comprados para 260, em razão da inflação galopante.
Então o Noronha me propôs comprarmos as viaturas sem licitar. Não pensei duas vezes e topei. Fiz um parecer justificando a “dispensa” da licitação apenas fundamentado na perda que o estado teria se tivesse que se submeter há toda burocracia ditada na Lei de Regência, pois deixaria de comprar mais viaturas face à desvalorização da moeda. Meu amigo Noronha acatou o parecer e determinou a compra dos veículos. Claro que tivemos a cautela de convidar todos os fabricantes de veículos, jornalistas e solicitamos ao Chefe do Ministério Público a designação de um Promotor de Justiça para fiscalizar o ato das compras.
E assim adquirimos por compra direta todos os veículos anteriormente pretendidos para repor em parte a frota das polícias. O processo montado no âmbito da Secretaria foi posteriormente remetido ao Tribunal de Contas do Estado que o aprovou a “sem ressalvas”. Sinceramente? Hoje eu não sei se arriscaria proceder com igual destemor porque os tempos são outros; na função pública todos são corruptos até prova em contrário.
Sempre tem alguém da imprensa decadente colocando dúvidas os bons atos dos gestores públicos, nem o Ministério Público é o mesmo e basta um único confete cair no chão para o bloco da oposição começar o carnaval da desgraça alheia ...
“Ser ordenador de despesa pública exige do agente público uma dose exagerada de cautelas. Não basta ter boa intenção e tentar proteger os interesses da Administração; hoje o servidor público é considerado corrupto até provar o contrário. Reflexo da corrupção petista que manchou a vida pública brasileira.”
Edson Vidal Pinto