Afinal para que serve o juiz?
Dentro do estado democrático de direito o Juiz é um agente político que detém o poder do Estado de buscar a harmonia social, decidir conflitos, punir os infratores da lei com notória imparcialidade, primando sempre com igualdade entre os jurisdicionados. Não existe democracia sem um Poder Judiciário harmônico e independente, porque ele representa a garantia dos direitos individuais dos cidadãos e o agasalho de todas as causas individuais ou coletivas que sejam justas e estejam ameaçadas por agentes públicos ou grupos sectários.
O Juiz, no entanto, só pode agir quando provocado. Exemplo? Ele não pode prender ninguém a não ser que exista um pedido formal para isto; salvo na condição de cidadão e estiver presenciando um crime que aconteceu ou está na iminência de acontecer quando então poderá dar voz de prisão em flagrante contra o infrator. Hipótese está legalmente autorizada como direito de qualquer pessoa do povo. Alinhada esta introdução vou agora ao cerne desta crônica.
Lembra que na semana passada um Juiz do estado de Santa Catarina indeferiu liminarmente uma Ação Mandamental impetrada contra o Prefeito de um determinado Município que decretou Lockdown fechando casas de comércios que não estão no elenco das prioridades básicas, sustentando o impetrante que o ato público violou o seu direito constitucional de trabalhar e lhe privou os meios que dispõe para prover as necessidades de sua família. O Juiz fundamentou sua decisão dizendo que pela excepcionalidade do momento de pandemia não cabe ao Judiciário interferir em medida que atende as normas ditadas pela Saúde Pública.
A decisão foi aplaudida, inclusive por muitos magistrados, por traduzir ato de prudência e bom senso. Peço licença para discordar. Quando o STF decidiu que cabe aos governadores e prefeitos juntamente com o Presidente da República equacionarem regras que visem combater a pandemia, por óbvio não deram “carta branca” para que estas autoridades possam (por mais justificáveis que possam aparentar os meios) simplesmente “lacrar” as cidades. Pois isto representaria ato despótico e impróprio para a sobrevivência econômica dos cidadãos.
O Juiz não pode simplesmente lavar as mãos quando a Lei lhe assegura o direito de aferir com acuidade o teor do ato oficial que resultou no Lockdown para resguardar minimamente os direitos das pessoas de ir e vir, trabalhar e produzir. Claro que dentro dos limites de isolamento e prudência regrados pelas autoridades sanitárias. Uma empresa comercial que receba nas suas dependências um número reduzido de clientes, todos usando máscaras e tendo álcool disponível, sabidamente, causa menos mal do que um ônibus lotado no início, meio e final do dia.
Ou até mesmo num supermercado que funcionando em horário reduzido tem muito mais possibilidade de reunir em seus espaços consumidores do que uma simples sapataria. E assim por diante. Uma loja que vende produtos através da mídia virtual precisa de empregados para embalar e remeter as mercadorias por correio -, qual o prejuízo para a saúde pública? E nessa conjectura é possível deparar com inúmeras situações que podem conviver há l margem do decreto extremo que está sufocando economicamente os cidadãos que necessitam trabalhar e produzir para poder viver.
E o Juiz tem que ter a sensibilidade de equacionar todos estes problemas e decidir com toda a sua experiência e bom senso o melhor “meio termo” para não desestabilizar economicamente os que vivem do trabalho. Há três dias atrás um Juiz do interior de São Paulo concedeu Habeas Corpus Preventivo para um advogado poder abrir e trabalhar em seu escritório. Sob minha ótica uma decisão justa. Enfim, nenhum Juiz nesta hora trágica e de desencontros que passa um país dividido pode negar o direito de prestar a jurisdição quando solicitada, pois não estamos num país comunista e nem ditatorial ...
“Nenhum Juiz pode negar a prestação jurisdicional reclamada por existir o ato público do lockdown. Este não é nenhum AI-5 e nem está acima da Constituição Federal. No Brasil, tem Juiz sim!!”
Edson Vidal Pinto