Edson Vidal

O Concurso Público

O ingresso no serviço público através de Concurso não é de hoje que é cheio de complexidades e de demandas judiciais. Claro que no século passado o número de concorrentes nem se compara com os de hoje e muito menos o alto preparo de conhecimento dos atuais candidatos. Vivemos o tempo dos cursinhos preparatórios que ministram aulas e ensinam os alunos a enfrentar o estresse das várias etapas do certame. 

Nos últimos dois anos presidi Concurso no Tribunal de Justiça para preencher 118 vagas de funcionários para os cartórios dos fóruns do interior do estado, que teve 168.000 inscritos e apenas 16 demandas judiciais (Mandados de Segurança) e todas elas julgadas improcedentes.

Mérito de uma qualificada Comissão de Concurso constituída por funcionários da Casa. Só sei dizer que pelo crescente número de concorrentes que querem um lugar no Ofício Público o gigantismo do certame gera problemas estruturais graves como encontrar lugares adequados para as realizações das provas. No concurso que me referi o Tribunal realizou as provas em diversas comarcas do interior do estado -, claro que buscando colocar os concorrentes em lugares mais próximos de suas residências e deixando preferencialmente a Capital para àqueles oriundos de outros estados. E tudo demandou um trabalho árduo e organização mais próxima da perfeição. 

As provas e fiscais foram de responsabilidade de entidade terceirizada e contratada para essa finalidade. Felizmente o certame foi concluído dentro do cronograma preparado (apesar do Covid). Mas tem concursos que se tornam verdadeiras aventuras jurídicas e embora as vagas tenham sido preenchidas ficam as surpresas como bombas retardas. Desta feita vou contar um destes episódios. No ano de 2.014 presidi  o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, órgão da Justiça da União, uma justiça especializada, estruturalmente bem qualificada e com funcionários com alto grau de competência. Era ano de eleições majoritárias para preencher cargos de governador, senador, deputados estaduais e federais; e o Tribunal estava assoberbado de demandas realizando julgamentos inclusive nos sábados e feriados.

De repente o inesperado aconteceu, pois recebi a intimação de uma ilustre Juíza Federal do foro de Curitiba determinando que eu nomeasse em dez dias sob as penas da lei, trinta e quatro candidatos de um concurso que havia sido encerrado há mais de dez anos pois o STF tinha reformado Mandado de Segurança e reconhecido seus direitos de aprovações naquele concurso. O relator foi o ministro Dias Toffoli. Li, reli e treli o teor do Acórdão do STF e fiquei pasmo com tantos sofismas para reconhecer a legalidade alegada pelos Impetrantes. 

Mas como decisão judicial não se discute fui ao encontro da MMa. Juíza subscritora da decisão intimatória. E quando fui recebido no seu gabinete disse-lhe:

- Doutora, sou o Presidente do TRE e vim me apresentar para ser preso.
Ela esboçou um sorriso e perguntou:
- Como? Não estou entendendo desembargador ...
- É que terei dez dias para nomear novos funcionários como diz a sua decisão, mas não tenho previsão orçamentária e por isso terei que praticar Crime de desobediência, passível de prisão!
- O prazo foi estipulado no Acórdão pelo ministro Toffoli e eu apenas estou cumprindo a decisão ...
- Eu sei doutora, eu sei. Só que eu não posso cumprir essa decisão...
E a magistrada de pronto concordou por ser a decisão inexequível. Daí conversamos como resolver o impasse e não encontramos saída. De volta ao gabinete no TRE Informei que não havia como nomear, elenquei os motivos e assim respondi para a Juíza. Até o término de meu mandato naquele Tribunal nunca mais recebi outra intimação para nomear ninguém.

E pelo que eu sei até hoje em dia o mandado de segurança em questão não foi cumprido. É sempre assim: quando o magistrado não tem a mínima noção do que está fazendo e decidindo é porque está no lugar errado, com certeza comendo pelas mãos de seus assessores ...


“Decisão inexequível ou inócua é aquela que não pode ser cumprida por não se coadunar com a lei. Ela leva a Justiça ao descrédito. É difícil imaginar que o STF de um país tenha decisões deste tipo.”

Edson Vidal Pinto

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