Edson Vidal

Depósito de Humanos

Não existe situação mais triste do que a velhice desamparada hoje quase  regra de uma sociedade licenciosa e em decomposição. São poucas os filhos que cultivam a tradição de estarem próximas dos pais e irmãos, compartilhando dos bons e maus momentos e dividindo as atenções para com os avós, sobrinhos, tios e primos. O distanciamento social decorrente do agito diário e da luta pela sobrevivência impôs condutas que não permitem mais vivenciar o calor humano dos parentes, então imprescindível para dar sentido à vida. Pelo menos é assim que pensam e justificam os mais jovens para dar as costas aos que lhes são mais próximos. E os idosos vivenciam calados e oprimidos a vida que não mais lhe pertencem. Pois quanto mais velho  e doente mais dependente e menos assistido. O velho tornou-se estorvo e quando doente um ônus econômico para a família. 

Claro que existem exceções, contudo, carreguei tragicamente nas tintas iniciais desta crônica para relatar episódio triste do qual tenho participado indiretamente e que envolve uma senhora idosa que tenho especial carinho. Ela, ainda jovem e recém casada, foi amiga querida de minha saudosa mãe. Hoje octagenária, viúva, com duas filhas distantes uma da outra, com netos  ausentes e bisneto pequeno vive só e doente. Quando o marido, um jornalista considerado e sócio de jornal era vivo, desfrutou da abundância e participou ativamente da vida social e sua casa era frequentada por políticos e intelectuais. Com o falecimento do provedor a família foi se desfazendo aos poucos do patrimônio para sobreviver com dignidade. 

Seu ganho foi reduzido numa pensão social. Com a idade foi acometida de doença degenerativa além das habituais crises de pânico. Os amigos e parentes foram se afastando e passou a ser assistida por um ou outro amigo que procuram cada qual há seu modo lhe dar o melhor conforto. Porém chegou o momento de não poder mais viver sozinha em seu apartamento. Vendo a necessidade de encontrar a melhor solução os parentes decidiram interna-la em casa de repouso. A irmã, uma filha e neta por sugestão desta última optaram por internar a velha senhora em uma casa de idosos.

Foi um tragédia. A casa bem decorada e de boa aparência serve de isca para cooptar comensais pois serve  de depósito de humanos sem condições de se autodeterminar e  com atendimento péssimo e funcionários agressivos. E minha querida amiga permaneceu internada por quatro noites até que pediu pelo amor de Deus que fossem lhe buscar, porque era a única pessoa consciente do local. O dinheiro pago antecipadamente para ficar hospedada por um mês não foi devolvido a pretexto de não  ser permitida  devolução de numerário se a contratante desistisse de permanecer na casa. Claro que amargou o prejuízo e voltou ao seu apartamento. Ou seja retrocedeu para o início da partida mas o problema permanece no aguardo de outra solução. Por quê será que o Ministério Público que está tão voltado aos temas sociais não fiscaliza estas tais “ casas de repouso” que na grande maioria não passam de depósitos de velhos ? Que cobram caro e não dão assistência conforme estipulado contratualmente ? Que não servem comida adequada porquê seus internos não tem lucidez mental suficiente para reclamar. Seus proprietários são negociantes sem humanidade.


E assim os filhos internam seus velhos e nem se preocupam como eles vivem nesses lugares horríveis. E o idoso cada dia que passa em maior número vai ocupando o mesmo espaço e protagonizando os mesmos problemas, sem esperança de merecer amor, respeito e  nem ser tratado com dignidade pelo muito que fez aos seus familiares .  Envelhecer é um estado de Graça mas para suportar a velhice o ser humano tem que ser muito corajoso …


“A medicina propiciou a longevidade aos seres humanos e criou um problema para as famílias modernas. A dependência dos idosos um fato que não se coaduna com o agito do dia a dia. A velhice desamparada cresce e poucos velhos são assistidos pelos parentes. E quando doente o ancião passa a ser um peso morto, - pronto para ser enviado a um depósito de rejeitados.”

Edson Vidal Pinto

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