No Mundo da Camisola
Tem ambientes que deprimem tanto que as pessoas pedem aos céus para não encontrar nenhum conhecido mesmo de longe, pois a vergonha é tanta que dá vontade de bancar o Luiz Ignácio e sumir do mapa. Nem falo de situações menos constrangedoras do que sentar numa mesa em festa de casamento ao lado do Renan ou do Gilmar; muito menos por ser visto dando carona para o governador do Rio Grande do Sul. Pois estas são circunstâncias da vida por serem absolutamente fortuitas e não programadas. Pior do que isto é quando você é obrigado para evitar o encontro precoce com a morte de entrar no estranho planeta das camisolas.
É um mundo em que pessoas trabalham de uniforme branco e os que chegam são tratados intimamente de “seo” fulano e de “você” sem a menor parcimônia só para colocar cada um no seu devido lugar. E você acaba aceitando porque não existe outra alternativa e nem rota de fuga. É claro que estou me referindo aos corredores de hospitais e clínicas médicas onde os “fregueses” são nivelados por baixo e ninguém ousa querer reclamar. Ontem revivi a experiência de fazer exame cardíaco e me submeter a uma tomografia computadorizada, tudo para saber como vai e como anda o meu sempre apaixonado coração.
Tudo porquê depois de enfrentar uma UTI fui diagnosticado como mais um cardiopata da Cidade Sorriso. Já perdi a contagem de quantas vezes fiz tal exame e em todas elas meu pior sofrimento, sem falar na aplicação do contraste químico, foi vestir a maldita camisola feita por algum estilista da Vila Pinto. Cruz credo, que falta de gosto. Vestir uma delas até que não é pior, a catástrofe acontece quando você tem de desfilar nos corredores como passarela de manequins às vistas dos mais argutos olhares que você nunca viu mais gordo na vida. As pessoas fingem que não estão rindo por fora mas por dentro estão a ponto de explodir. E você não tem a mínima possibilidade de tentar evitar a vergonha que está passando, pois a camisola não tem mangas e o pano termina acima dos joelhos. Acho que é como estar vestido de mini-saia e blusa sem mangas.
Dá vontade de sair gritando e deixar tudo para trás e depois perseguir o médico que indicou o exame e bater nele com um gato morto até miar. Gente você se torna um espectro de homem. Depois que você vestiu aquele traje de festa caipira podem fazer o que quiser pois ninguém de sã consciência tem coragem de reagir ou desobedecer. Você vira um autômato e obedece ordens. Vire de lado, respire fundo, solte o ar dos pulmões, coloque o braço atrás da cabeça, o outro também, não se mexa e você faz tudo sem nenhum resmungo com medo de que possam te deixar dentro do tubo da máquina por alguns dias. Ninguém é capaz de perguntar se está frio e você quer um cobertor; muito menos oferecer um café com bolacha ou uma maçã. Nada disto. Você entra na sala de exame com a sua camisola e sai dela com o mesmo traje e com cara de zumbi. E o médico nem olha em sua direção e muito menos faz um gesto de boas-vindas ou um adeusinho com as mãos.
Para ele você é mais um invisível que apareceu no ambiente de trabalho. De repente você está liberto. Volta para o vestiário, tira a camisola e para se vingar você arremessa a dita cuja num cesto de roupa suja. Com certeza no dia seguinte a famigerada camisola vai “vestir” outro pobre coitado que vai fazer igual ritual. Estou ficando com birra desse traje de senador romano e qualquer dia vou de pijama, com meu próprio pijama que comprei com o meu dinheiro, só para fazer o exame. E ai se algum engraçadinho teimar que tenho de vestir a camisola pois vou ficar um leão. Claro que um leão velho, sem unhas, sem dente e sem força para dar “aquele” urro assustador, daí vou vestir a camisola mas ninguém nunca verá uma cara tão feia como a minha …
“Suplício pior que uma UTI é vestir o famigerado traje hospitalar. Depois que você está embutido dentro dele você não é mais do que sempre foi, pois você se torna um banana e obedece a todos como um cordeirinho. A dita camisola destrói qualquer reputação.”
Édson Vidal Pinto