A Filha de Zeus
Quando acadêmico há mais de cinquenta anos atrás do Curso de Direito aprendi da forma mais elementar que “direito” é bom senso, ou seja, aquele que tiver sensibilidade para diferenciar o que é certo e o que é errado bem como o que é justo e injusto, tem plena consciência para discernir as bases da Ciência do Direito. E também : que o ato de julgar deve levar em conta os alicerces do Direito e a compreensão dos acontecimentos contemporâneos que aflige a sociedade para impor a paz social.
Nessa conjugação é que o Juíz deve aplicar a lei sem nunca perder a noção que seu papel é distribuir Justiça. Em outras palavras o Juíz deve ser o homem do seu tempo e decidir com razoabilidade as divergências mais latentes de maneira simples e objetiva. E partindo deste preâmbulo ninguém duvida que há muito tempo a sociedade brasileira trava discussão sobre a confiabilidade ou não da urna eletrônica usada nas eleições -, tem muitos profissionais da área da computação que juram de mãos juntas que podem manipular os resultados das eleições porque a urna é uma máquina como qualquer outra, de outro lado também têm aqueles que põem as mãos no fogo se alguém conseguir burlar o resultado das eleições.
E não adianta querer explicar e nem justificar aos que pensam que as eleições possam ser fraudadas porquê são os Juízes e os Promotores de Justiça, bem como os integrantes dos Tribunais Especializados, os principais responsáveis pela fiscalização e lisura dos pleitos e que nada poderia acontecer para alterar o rol dos eleitos sem a conivência criminosa das referidas. autoridades. Fui Presidente do TRE do Paraná e senti de perto a dúvida sempre estampada nos olhos dos eleitores.
E pelo que sei esta duvida da urna poder ser manipulada ou não ainda persiste. O deputado estadual do Paraná, delegado Fernando Francisquini, no último pleito foi eleito com 471 mil votos e na época da sua campanha foi um candidato que numa live colocou em dúvida a lisura do pleito por entender que a urna eletrônica é passível de manipulação. E como ele milhares de outros candidatos pelo país afora, inclusive o então candidato Bolsonaro atual Presidente da República. E por esta postura o deputado foi processado pela Justiça Eleitoral paranaense e absolvido por se tratar de mera opinião sem nenhum reflexo lesivo para quem quer que seja.
Houve recurso para o TSE e nesta semana o relator Luiz Felipe Salomão no seu voto propôs a cassação de Francisquini sendo acompanhado pelos maioria de seus pares, sob o fundamento que a live teria influenciado o resultado das eleições. Mero jogo de palavras e sofismas pois não existe prova de que o pronunciamento do ex-deputado tivesse se prestado para alterar o resultado do pleito. Portanto a partir deste julgamento a urna eletrônica passa a ser filha de Zeus - deus dos deuses da mitologia grega - e aquele que ousar atentar contra a sua inviolabilidade sofrerá a ira de todos os deuses do Olimpo moderno residentes em Brasília.
E com a Justiça feita não há que se falar mais sobre as abençoadas urnas eletrônicas. E o direito de opinião só prevalece para quem tem pistolão com toga. E aberto o precedente a cassação do Bolsonaro está com os dias contados porque ele também colocou em dúvida a pureza da filha de Zeus. Claro que o Francisquini ainda pode recorrer da decisão do TSE para o STF -, que aguardará o recurso de braços abertos para confirmar a polêmica cassação, pois logo, logo, um peixe grande virá na mesma isca …
“Não é admissível que opinião de candidato colocando em dúvida a lisura do pleito por ser a urna eletrônica manipulável, sirva de argumento para alterar o resultado da própria eleição. O eleitor pode não saber votar bem, mas sabe muito bem em quem quer votar.”
Édson Vidal Pinto