Um Domingo Na Lapa.
Embora nascido em Curitiba corre em minhas veias metade de sangue lapeano pois minha mãe, avós maternos e tios nasceram na tradicional cidade da Lapa, localizará a sessenta quilômetros da Capital, lugar em que também morei com minha esposa e filho quando fui Promotor de Justiça daquela Comarca. Moramos numa casa alugada na rua Cel. Eduardo Corrêa, atrás da Igreja Matriz de Santo Antônio, padroeiro da cidade. O curioso é que o Santo mais festejado pelos lapeamos é o São Benedito, o negro, que tem uma basílica construída em sua homenagem e no seu aniversário é uma grande festa, com procissão que reúne milhares de devotos (inclusive eu) pois participei por alguns anos da minha adolescência, vestindo opa, carregando vela, sempre para pagar promessa que minha mãe fazia por razões que ela nunca me contou. No início dos anos 70 do século passado a Lapa era um sossego só, nos dias da semana com poucas pessoas caminhando entre os casarios e ruas de paralelepípedo, e os automóveis eram poucos e ninguém tinha o hábito de buzinar porque não havia estresse no trânsito. Existiam na época dois hospitais, um localizado há poucos quilômetros antes de chegar na cidade denominado “Sanatório São Sebastião” para pacientes tuberculosos, pois o clima da região era indicado como tratamento indispensável; e o outro construído na Praça da Igreja Matriz tinha o nome de “Hospital Hipólito Alves de Araújo”, cuja lavanderia foi construída com doações da comunidade, por iniciativa de uma comissão de cinco pessoas radicadas na cidade e do qual tive a honra de participar. O lapeano não é muito de visitar ninguém embora seja muito hospitaleiro quando recebe visita, minha esposa na época era recém casada e a única amiga que nos visitava era dona Alice Leoni, uma senhora de idade avançada, esposa do saudoso médico dr. Pedrito Leoni que gostava muito de minha mulher e por achar que era ficava muito sozinha gostava de fazer companhia para ela, enquanto eu trabalhava. E nem sempre a d. Alice aparecia na minha casa e minha mulher passava o dia todo cuidando da casa e do nosso filho primogênito. Era assim a vida de nossas amadas esposas que saiam de Curitiba para acompanhar seus maridos, morando em diversas Comarcas e regiões diferentes do estado, passando parte de suas juventudes longe dos grandes centros e de seus pais e demais familiares. Não era uma vida nada fácil, morando em casas alugadas, sem conforto, comércio insipiente e sem muitos lugares para visitar. Se nos finais de semana a cidade da Lapa era pacata em demasia, quando chegava no domingo, os turistas lotavam o lugar chamado de “Monge”, um morro, tipo chapada, com pedras, escadarias, grutas enormes e piscina natural de pedras, onde diziam ter morado um monge chamado João Maria D’Agostinis em uma das grutas, ele era um homem místico, estudava as plantas, fazia profecias, orações e milagres. Com um gramado imenso o local era próprio para fazer churrasco, praticar esportes e usufruir de sua beleza rústica. Claro que eu também levava minha família para ver o grande movimento de pessoas pois era uma distração para fugir do silêncio da cidade. Ás vezes alguns sitiantes promoviam corrida de cavalos, chamado “raia”, quando o terreno devidamente sinalizado em duas grandes linhas retas de trezentos metros, corriam dois cavalos montados por exímios cavaleiros, fazendo a atração do “Monge”. Claro que as apostas corriam solta.
O curioso era a corrida de um homem, fundista, com um cavalo montado por um cavaleiro, com o animal tendo de percorrer os trezentos metros da linha de partida até a chegada, e o corredor apenas os cem metros finais. A torcida em favor do fundista era enorme e muitas vezes este ganhava do cavalo. O prêmio em dinheiro diziam que era muito bom. Era assim a diversão domingueira de quem, como eu, morava na Lapa. E quando chovia no domingo o passeio depois do almoço era dar uma volta no pátio do Sanatório São Sebastião, para ver os porcos, cabritos, galos, galinhas e coelhos para a alegria do nosso menininho, com um pouco mais de dois anos de idade …
“A vida profissional exigia que Juízes e Promotores morassem com suas famílias nas Comarcas do interior do estado. Época em que muitos passaram grande parte de suas juventudes longe da Capital, trabalhando arduamente e quase sempre morando em casas de nenhum conforto. A vida era difícil e ao mesmo tempo prazeirosa porque viver nas pequenas cidades foi uma verdadeira lição de vida”