Edson Vidal

O Ronco Nosso de Cada Dia.

Não adianta fingir e nem negar, depois dos cinquenta anos de idade,  roncar faz parte da vida de todo o ser humano. Parece um barulho extra que incorpora os hábitos daqueles que têm certa quilometragem de vida. E o pior estágio é quando o próprio roncador acorda com o grunhido do seu próprio ronco.

E o mais hilário é quando você encontra alguém que nega peremptoriamente o que é um roncador, demonstrando desprezo por quem ronca, por ser um esnobe entre os mortais. A regra número um do cientista mais gabaritado sobre o assunto é a certeza de que quanto mais a pessoa ronca mais velha ela é; e não adianta depois querer esconder a idade.

Existem varias tipos de roncos. Sou estudioso no assunto, pois sendo um atento observador dos fatos do cotidiano, tenho identificado e classificado sons e ruídos que saem, ou da garganta de uns, ou do fundo do âmago de outros, propiciando diferenciar e nominar cada um destes fantasmagóricos barulhos.

Ele é perfeitamente identificável, basta que o paciente se entregue aos braços de Morfeu,  em qualquer hora e lugar. Sem sofisticar gostaria de dizer que identificar as maneiras de roncar é uma ciência, quase exata quanto à física quântica. Quem conhece esta última com certeza sabe muito bem do que estou escrevendo.

Nos meus estudos levei mais de meio século para distinguir os ruídos do ronco, nesta oportunidade vou revelar apenas alguns, para matar a curiosidade do leitor. Assim, vejamos: “miadinho”é um ruído gutural que parece um gato miando, ele se confunde um pouco com o chiado de um asmático em crise, só um experto pode diferenciar uma coisa da outra; “viatura policial” é o ronco estridente que para de repente para recomeçar logo em seguida; “Serra elétrica” é o que tem o som longo e só para quando o tronco de madeira imaginário foi cortado; “marcha de carro”, é aquele cujo som muda de tom a cada momento; “Robson Crusué”, é o ronco solitário que leva algum tempo para ser repetido; “Luiz Ignácio”, tem o som rouco e suficiente para espantar quem estiver ouvindo; “ saindo do armário”, quando o som é modulado, fininho e sem muita potência; “Caruso”, quando é demasiadamente alto e doe nos ouvidos.

E também tem os tipos de roncadores: “me engane que eu gosto”, quando o roncador é subitamente acordado quando está fora de tom; “antes só do que mal acompanhado”, quando o roncador dorme em quarto separado da mulher; “escafandrista”, é aquele que ronca dentro da máscara para evitar apneia; “cara de pau”, o que ronca dentro de avião em voo doméstico; “taxista”, é aquele que não pode ver assento e começa a roncar; “Múmia” é todo aquele que ronca sem nenhuma expressão facial: “Mulherengo” é quem ronca assoviando; “dono de orquestra”, é aquele que ronca e assovia ao mesmo tempo; “Atleticano”, o que ronca de barriga cheia; e “Aviador”, é roncador que sonha estar nas nuvens.

E sabe que tem médico para tratar do ronco? É na verdade uma especialidade abraçada por quem academicamente pensa que não ronca; em suma,  um profissional que ganha dinheiro com ronco alheio. Estou querendo um escrever futuramente um livro abordando exclusivamente sobre o bom e inseparável ronco nosso de cada dia e noite.

O que até agora escrevi foi um rápido ensaio para ser digerido como leitura de domingo. Espero que você leitor, esteja confortavelmente sentado em uma confortável poltrona na frente da TV, logo depois de almoçar um gostoso leitão a pururuca, assistindo um jogo do Paraná. E se você não dormir e nem roncar, belisque-se, para ter certeza de que ainda está vivo...

“Chama-se ronco, o ruído que o ser humano inventa depois de envelhecer. Quem diz que não ronca, não sabe o que é bom. Só morre roncando quem se afoga na própria amargura. E só ronca quem tem quilometragem etária que causa inveja aos mais jovens!”
Edson Vidal Pinto

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