A lei sobre o regime jurídico emergencial e sua aplicação no direito condominial
O projeto de lei nº 1179 convertido na lei ordinária nº 14.010 de 10 de junho de 2020, estabelece que a assembleia condominial e a respectiva votação, poderão ocorrer, em caráter emergencial, até 30 de outubro deste ano, por meios virtuais, de forma que a manifestação de vontade de cada condômino será equiparada, para todos os efeitos jurídicos, à sua assinatura presencial. E caso não seja possível a realização de assembleia condominial – ainda que virtual –, os mandatos de síndico vencidos a partir do dia 20 de março de 2020 ficam prorrogados até o fim do mês de outubro. Por fim, ainda foi determinada como sendo obrigatória, sob pena de destituição do síndico, a prestação de contas regular de seus atos de administração.
Entretanto, em que pese a sanção à referida lei, em especial, aos artigos 12 e 13 atinentes a área condominial, o fato é que o veto presidencial à integralidade do artigo 11 do PL 1179, impõe uma limitação administrativa e gerencial ao administrador do condomínio, no caso o síndico, em plena pandemia do novo coronavírus.
Isso porque, a restrição à utilização das áreas comuns, respeitando o acesso à propriedade exclusiva dos condôminos, aliada a contenção ou proibição de realização de reuniões e festividades e o uso de abrigo por terceiros – como medida provisória e necessária para evitar a propagação do coronavírus – se fazem de extrema importância, dado o caráter emergencial e de alerta vivido no mundo todo.
Nesse período de pandemia, enquanto muitas pessoas estavam em isolamento social, trabalhando via home office, os síndicos, de um modo geral, continuaram em plena atuação na linha de frente do problema, visando adequar o seu condomínio a nova realidade. Atuando na administração do condomínio, o sindico também era responsável por garantir os cuidados necessários para assegurar a saúde de funcionários, prestadores de serviços, terceirizados e visitantes. Ainda deveria fiscalizar e garantir a limpeza e higienização dos ambientes do condomínio, proibir a utilização de áreas comuns, adotar medidas preventivas e de combate ao novo coronavírus e acompanhar de perto a inadimplência dos condôminos. Além de tudo isso, ele também precisava gerenciar os gastos extras investidos nas medidas de contenção e acalmar possíveis animosidades e aflições de moradores mais exaltados em virtude da situação excepcional.
Dito isso, o veto aos dispositivos que legitimavam uma atuação mais independente do síndico – com medidas necessárias em face da situação excepcional que estamos passando –, bem como as divergências de informações entre os governos federal, estadual e municipal, as crises de origens políticas, econômicas e de saúde, os embates no judiciário e dentre outros fatores, ocasionam mais desgastes e dificuldades para registrar a possibilidade de uma nova realidade, qual seja, a deliberação de moradores sobre assuntos de seus interesses mediante assembleia virtual.
A justificativa para o veto presidencial ao artigo 11 do PL 1179 se deu em razão de que tais questões – restrição da utilização das áreas comuns e a proibição de realização de festividades nas áreas privativas – seriam melhor discutidas em deliberação durante assembleia geral. Entretanto, em que pese a pretensão inicial de se conceder uma autonomia aos síndicos, esta seria em caráter emergencial e limitado, podendo ser adotada e revista de forma célere, uma vez que seus atos proibitivos e restritivos teriam validade apenas e tão somente até 30 de outubro deste ano, ou seja, em um momento que depositamos as esperanças de que será um pouco melhor e menos caótico, com a epidemia em maior controle e que ainda contaremos com mais informações e orientações para enfrentarmos a situação extrema e delicada que nos assola.
Lado outro, é fato que a área condominial pela familiaridade com a administração pública sofre com a oposição a atos e fatos de seus moradores, tal qual acontece em qualquer governo com aliados e oposição. Melhor dizendo, o consenso quanto as atitudes do administrador ou síndico são relativas e nunca agradam ou desagradam a todos.
No entanto, o direito condominial ainda não é visto com o destaque e atenção que lhe é devido pelo legislador, isso porque, os inúmeros conflitos existentes nos condomínios deixam claro, a ausência de bom senso nas relações humanas entre moradores; a exteriorização do egocentrismo; a elevada sensibilidade psicológica; a insegurança à situações excepcionais, como por exemplo, uma pandemia; e a necessidade de liberdade do síndico para a adoção de medidas rápidas e emergenciais em situações especiais.
Isso tudo para expor que o síndico merece e necessita de autonomia para deliberar sobre assuntos relevantes, que merecem uma ação rápida, incisiva, segura, sem que tenha que se socorrer a uma assembleia. Vale lembrar que o projeto de lei tem prazo final determinado, ou seja, a decisão e atuação do síndico – com medidas extremas ou não – tem um prazo final de vigência e validade.
Diante da nova lei, não restou alternativa ao síndico senão a convocação de assembleias virtuais para a deliberação sobre assuntos que se mostrarem necessários e mais sensíveis em plena pandemia, como por exemplo, a limitação ou restrição ao uso da academia, piscina, salão de jogos, brinquedoteca, parques e dentre outros – enfim, discutir sobre o uso de áreas comuns e regras transitórias que serão implementadas no ambiente condominial.
Por Marcio Zuba de Oliva, advogado especialista em Direito Condominial