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Os riscos da extinção
da fança nas locações
de imóveis
R
ecentemente, retornou à agenda das discussões no Senado o projeto de lei (PLS
29/2003), com o objetivo de acabar com a fança como modalidade de garantia em
contratos de locação de imóveis urbanos. O autor do Projeto, senador Paulo Paim
(PT-RS), argumenta que a exigência de fança para contratos de locação, além de trazer
“sérias difculdades” aos proponentes locatários, coloca eventuais fadores em situação
de “constrangimento”.
A proposta de alteração da Lei do Inquilinato, nº 8.245/91, embora com a intenção de fa-
cilitar os negócios locatícios para inquilinos e seus fadores, mostra-se inadequada ao fm
proposto e denota um gritante contrassenso, uma vez que pode proporcionar mais pre-
juízos que benefícios aos negócios de locação.
A avaliação do Projeto exige um exame das bases de suas justifcativas, e, principalmente,
dos possíveis desdobramentos e consequências de uma possível aprovação da proposta.
Pela fança, inserta nos arts. 818 a 839 do CC/2002, o fador está obrigado cumprir uma
obrigação ou pagar uma quantia ao credor, por eventuais inadimplementos e dívidas do
devedor principal. Nas relações locatícias, isto quer dizer que se o Locatário não pagar as
contas, o fador vai assumir o débito.
É difícil sustentar a pertinência do argumento de que as exigências dos proprietários de imó-
veis e de imobiliárias para aceitação de fador - tais como, apresentação de comprovantes de
rendimentos, comprovação de bens em valor igual ou superior ao do contrato, etc. -, propor-
cionam situações vexatórias aos inquilinos e seus fadores. Tem-se que a comprovação da sol-
vabilidade do fador, ou seja, sua capacidade de econômica para garantir o cumprimento de
obrigações inadimplidas pelo inquilino, mostra-se imprescindível para que a contratação da
fança, como garantia da locação, seja viável. De outra forma, esvaziaria de sentido a fança,
indicar fador que não comprove sua capacidade de pagar eventuais dívidas do afançado.
Some-se a isso que o projeto não elimina o dever do Locatário de apresentar garantia às
locações. O que se propõe é, tão somente, reduzir as alternativas de garantia apresenta-
das no art. 37 da Lei do Inquilinato, a saber: caução, fança e o seguro fança. Diminuir as
possibilidades de garantia traria desvantagens incontestáveis aos proponentes locatários
e, de uma maneira geral, prejuízos aos negócios imobiliários.
Dentre as garantias locatícias, a fança é a modalidade mais usada, principalmente por não
ser onerosa a nenhuma das partes contratantes. O pior efeito da extinção da fança seria
onerar, ainda mais, o inquilino, uma vez que as demais modalidades de garantia exigem
ummaior desembolso para contratação, muitas delas sem recuperação do dinheiro gasto
- como o seguro garantia -, ampliando as difculdades na hora da contratação.
Para os locadores os efeitos da extinção da fança serão mais limitados. Apesar da Lei do
inquilinato enumerar as alternativas de garantia, proprietários e administradora de imó-
veis podem determinar a modalidade que melhor os atende, em detrimento às demais
(segundo o Código Civil, o credor não é obrigado a aceitar fador). A experiência no merca-
do imobiliário nos mostra, que cada vez mais locadores passam a requisitar a fança ban-
cária e o seguro fança para garantia das locações, tirando o espaço do tradicional fador.
Contudo, arelevânciadafançaestánofatoderepresentaramodalidadedegarantiamaisutilizada
para locações. Segundodados doCreci-SP (ConselhoRegional deCorretores de Imóveis), em2013,
sóna cidade de SãoPaulo, 43% dos novos contratos de aluguel foramgarantidos por fador.
Note-se, daí, o papel de fomento aos negócios imobiliários que desempenha a fança.
Claramente, a extinção dessa garantia poderá desanimar a realização de novos negócios,
posto que ao aumentar o custo da locação, os proponentes locatários reposicionarão
seus investimentos, afetando negativamente o próprio mercado imobiliário.
Pelo exposto, o Projeto de extinção da fança não é justifcável seja pela incongruência de
sua justifcativa, seja do ponto de vista econômico - por inibir a realização de novos negó-
cios, que desdobra-se em prejuízo ao mercado imobiliário -, além de não promover os re-
ais interesses de inquilinos e proprietários de imóveis.
Mudanças legislativas devem ter como missão precípua
buscar instrumentos que incentivem as contratações,
sem onerar às partes, e, principalmente, que não res-
trinja a segurança jurídica nas relações locatícias.
Por Heber Bruno Filgueiras Fechine
Heber Bruno Filgueiras Fechine
Advogado da área de negócios de Rocha e
Barcellos Advogados