Revista Ações Legais - page 44-45

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ARTIGO
A reforma trabalhista
e as contribuições
previdenciárias
Por Marcelo Diniz Barbosa, advogado
N
o início de novembro entrou em vigor a “refor-
ma trabalhista” (Lei 13.467/2017), que alterou
profundamente a CLT e normas esparsas rela-
cionadas, como a Lei 8.212/1991. Há novidades que têm
reflexos tributários, pois aspectos das hipóteses de in-
cidência das contribuições previdenciárias sobre verbas
usualmente pagas foram modificados.
As rubricas que merecem atenção são: a ajuda de custo,
as diárias para viagem, os prêmios e os abonos. A ha-
bitualidade, antes premissa suficiente para a caracteri-
zação da natureza salarial, foi expressamente afastada.
Valores pagos com estas naturezas não serão mais in-
corporados aos salários, para efeitos trabalhistas (refle-
xos), tampouco ao salário de contribuição, para efeitos
previdenciários (contribuições), ainda que pagos habi-
tualmente.
Contudo, essas importantíssimas modificações não im-
plicam autorização para a utilização indiscriminada des-
tes “títulos”, com o objetivo de evitar as contribuições
previdenciárias. Todos os aspectos jurídicos definidores
de cada verba devem estar presentes, do contrário, os
pagamentos poderão ser integrados aos salários para
efeitos trabalhistas e previdenciários.
Tal qual antes da reforma, o pagamento da ajuda de
custo permanece exigindo a correlação com as despe-
sas suportadas, devendo ser possível demonstrar a ade-
quação econômica dos valores.
Um bom exemplo é o custeio da moradia no Brasil de
colaboradores expatriados. Com a mudança legislativa,
o risco da integração dos pagamentos a título de hou-
se allowance (aluguel; reembolso de aluguel; hotel) aos
salários pela falta de previsão contratual de termo para
a extinção do benefício fica bastante reduzido. Entretanto, se a importância mensal da ajuda
for evidentemente superior ao que seria gasto, considerando a situação concreta (cidade, lo-
calização da empresa, tipo de imóvel etc), há grandes chances da desconsideração da ajuda de
custo e de que em eventuais discussões trabalhistas e/ou fiscal a natureza salarial seja reconhe-
cida, com a consequente exigência das contribuições previdenciárias.
As mesmas ressalvas quanto à pertinência entre pagamentos e despesas aplicam-se às diárias
de viagem. Por mais que o limite para o pagamento das diárias em até 50% do total do salário
tenha sido revogado, seguramente o empregador não poderá utilizar essa rubrica em subs-
tituição à remuneração do próprio trabalho, o que poderá ser evidenciado, por exemplo, no
caso de o valor ser flagrantemente superior ao custo diário razoavelmente estimado das via-
gens realizadas.
As maiores discussões, todavia, envolverão os prêmios e abonos. Estas verbas não são defi-
nidas pela legislação de modo preciso e acabam sendo adotadas com excessiva liberalidade,
muitas vezes em situações claramente contrárias à melhor interpretação das novas normas.
Com efeito, a CLT define os prêmios como os pagamentos “por liberalidades concedidas pelo
empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a empregado ou a grupo de
empregados, em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de
suas atividades” (art. 457, §4º).
A confirmação da natureza não salarial e, portanto, da não incidência das contribuições pre-
videnciárias depende do conceito de “desempenho extraordinário”, parecendo evidente que
o pagamento não pode decorrer de objetivos que usualmente seriam atingidos por trabalha-
dores em situações normais e equivalentes ao do colaborador premiado. Deve ser possível
demonstrar quais são os resultados esperados do homem médio e quais os índices que carac-
terizam a superação desses níveis e, essencialmente, o efetivo atingimento destes patamares
pelo trabalhador. Uma boa política interna de premiação, divulgada com antecedência, devi-
damente aferida e registrada pode ser um bom começo.
E, por fim, em relação aos abonos, não há definição legal expressa, o que dificulta ainda mais
uma análise conclusiva. Porém, a partir de outras fontes do direito, em especial a jurisprudên-
cia e os costumes, é possível conceituar o abono como importância paga em compensação à
supressão de direito garantido na lei ou contratualmente ao trabalhador.
Os exemplos mais conhecidos são o abono de férias – conversão em dinheiro de 1/3 das férias –
e o abono salarial pela postergação negociada da data base de atualização de salários. Assim, a
regularidade de qualquer abono depende da demonstração objetiva de que serve à compensa-
ção de direito não exercido pelo empregado, sob pena de ser declarada sua natureza salarial.
Em conclusão, sabe-se que o momento é de muito mais dúvidas que certezas e qualquer pre-
tensa interpretação definitiva das novas normas seria absolutamente temerária. Entretanto,
pode-se antever a existência riscos concretos para os empregadores que não analisarem com
cautela alternativas de remuneração que envolvam as verbas alcançadas pelas mudanças le-
gislativas.
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