Edson Vidal

Uma Crônica de Ontem.

Sentei na minha poltrona preferida do escritório em meu apartamento, com intuito de escrever uma nova crônica diária quando lancei os olhos sobre um arquivo que contem muitas delas escritas ao longo dos últimos anos, e resolvi escolher uma para a pauta de hoje. Não, não vou reproduzir a mesma na íntegra mas escrever uma releitura de seu conteúdo a título de curiosidade. Com o título “A Festa Continua” a crônica está datada de 04 de março de 2.017, que caiu num domingo, e o assunto abordado foi o tema de um livro que eu acabara de ler de autoria de  Alan Riding (Editora Companhia das Letras), que descreve sobre a vida cultural francesa no período da ocupação nazista no ano de 1.940. Naquela época a política do Reich Alemão era incentivar o maior número de espetáculos artísticos que pudessem ser realizados em Paris, para tornar menos conflituoso o domínio sobre a França. A velha história do pão e circo. Um tempo em que Paris era o polo convergente de grandes e consagrados artistas como Matisse, Picasso, Rodin, Camus, Rochelle e tantos outros escritores, filósofos, produtores de cinemas , poetas, atores, cantores e de casas de espetáculos lotadas que faziam a efervescência cultural da Europa. Este o cenário descrito no livro, com abordes às censuras políticas aos que resistiam a invasão e a licenciosidade com que eram tratados os colaboracionistas. E nos quatro anos de ocupação a capital francesa teve mais produções artistas e a indústria cinematográfica produziu muito mais filmes do que em outros tempos. Os teatros funcionavam todas as noites, festas por todos os cantos da cidade, dando a impressão que a guerra estava em outro mundo. As perseguições aos judeus não tinham maiores repercussões pois o povo estava mais embevecido pelo ritmo diário da cidade, embalado por bandas militares e festas. É claro que a libertação da França ensejou a seguir à caça às bruxas, com os colaboracionistas sendo perseguidos, desmascarados e julgados pelos Tribunais judiciais e Políticos. No livro o autor relaciona os nomes de todos os artistas simpatizantes do regime nazista e as respectivas sanções que sofreram. Para quem aprecia conhecer a história o livro é um prato cheio. Com cuidado para não aprofundar mais sua leitura a fim de não tirar dos futuros leitores o sabor de seu rico conteúdo, vou pinçar um pequeno trecho cujo protagonista foi o grande Picasso, como sabido nascido em Espanha e que por ter lutado contra o Franco e este ter assumido o poder em seu país, fugiu e foi morar em Paris.  Seu ateliê era próximo do Rio Sena e de quando em quando recebia Oficiais do Exército Alemão sequiosos para adquirir suas pinturas. Picasso era um artista consagrado na época. Certa vez chegou em seu estúdio um Marechal de Campo de Ocupação, que deu de cara com o célebre quadro denominado “Guernica” que o artista acabara de pintá-lo e que retrata o ataque aéreo de pilotos alemães contra um grupo de resistentes ao General  Franco, na Revolução Espanhola que contou com a ajuda explícita do Governo Alemão. A obra mostra o massacre pela desproporção de armas. 
O Marechal olhou por algum tempo o quadro e depois perguntou para Picasso: 
- Você fez isso ? 
E o artista sem titubear respondeu:
- Eu não! Foi você que fez!!!
O quadro de Picasso está exposto no Museu do Prado, em Madri. O episódio colacionado foi apenas um dentre dezenas retratados no livro. E assim, aproveitei duplamente a oportunidade pois reproduzi um escrito de anos atrás e ao mesmo tempo redigi minha crônica de hoje. Sei que cada leitor tem gosto diferente para leitura, porém, caso o tema não tenha agradado para comprar o livro, espero, ao menos, que esta leitura tenha se prestado para tornar mais agradável o seu dia … 


“Paris na sombra da ocupação nazista foi uma cidade em festa, para apaziguar os ânimos de seu povo. Imperou a licenciosidade, o luxo, a farta iluminação para engambelar os resistentes e cooptar os colaboradores. É a técnica cênica dos opressores para evitar confronto com os conquistados.” 

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