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ARTIGO
Delações premiadas na
longa cauda da Justiça
Por José Samurai Saiani, advogado
O
intenso, profundo e detalhado noticiário
sobre a delação ou colaboração premia-
da dos sócios da empresa J&F levantaram
enormes dúvidas relacionadas às práticas políticas,
de negócios e do funcionamento da polícia, do Mi-
nistério Público e do Poder Judiciário. Como tudo
que se conta precisa ser provado, depois de inten-
so bombardeio, não veio a terra arrasada. De fato,
feneceram as impressões de se estar diante de de-
núncias capazes de extinguir a galáxia – afinal, o fim
do mundo foi prometido com as revelações da Ode-
brecht. Para a sociedade, restou a impressão dos
abalos se restringirem a suspeitas sobre o uso do
banco oficial de fomento econômico como instru-
mento à busca de recursos para campanhas políti-
cas. Mas a ideia - aventada por muitos - de que nada
mudou é imprecisa.
A forma como foi estruturada a delação da J&F, o
que saiu até o momento na imprensa e o nível das
pessoas envolvidas na reviravolta dos fatos têm sim
a capacidade de gerar dúvida sobre a eficácia e a
continuidade do instituto da colaboração premiada.
Mas apenas para quem se atém à interpretação do
que é coberto pela mídia. O objetivo, a estrutura e
os meios para atração de colaborações premiadas
permanecem incólumes.
Como a Lei Anticorrupção e os acordos de leniência,
as delações premiadas são figuras novas na legisla-
ção. Suas aplicações foram intensificadas no rol de
escândalos a partir da Operação Lava Jato. Das re-
servas quanto ao seu uso passou-se- num tempo bem curto - para o entendimento de ser
ferramenta legítima para estratégias de defesa. A jurisprudência está sendo construída
pela cauda longa da Justiça.
Essa cauda compreende a sua aplicação em milhares de casos por todo o país. Processos
que mal conseguirão chegar aos blogs de comunicação das localidades onde ocorrem.
Mas para os quais as autoridades públicas têm a obrigação de apurar e diante de indícios,
instaurar inquéritos, apresentar denúncia e dar andamento ao devido processo legal. O
instrumento está sendo usado cada vez mais intensamente.
Outra coisa superimportante que precisa ser mais e melhor informada é sobre a intenção
natural da delação premiada combinada com os acordos de leniência e a legislação con-
tra atos de corrupção. A aplicação da justiça não deve gerar danos que punam além dos
culpados.
Isso significa muitas vezes aplicar a lei apenas sobre as pessoas responsáveis pelos atos
criminosos, evitando-se ampliar os prejuízos econômicos decorrentes destes processos
para a empresa e toda a cadeia de fornecedores envolvida.
A aplicação de multas relevantes e a exigência de aplicação de ambiente livre das influên-
cias que levaram a prática ilegais são as virtudes de casos como a da gigante alemã Sie-
mens. Não deixaram quebrar, preservaram empregos, afastaram os responsáveis, cria-
ram uma nova realidade.
A legislação brasileira tem o mesmo intuito e estabelece mecanismos capazes de fazer o
mesmo. Precisamos apenas saber como cumprir isso. Se não o fizermos, o problema não
será se o estatuto legal funciona ou não. Mas saber as razões de porque nós – operadores
do direito e aplicadores da Justiça – não conseguimos fazer que funcione. Esta mudança
depende mais do que temos como objetivo de longo prazo enquanto compromissos com
o país do que de interesses que influenciamnomomento da adoção das medidas judiciais.