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ARTIGO
Delação premiada
Por Marcelo Leonardo
O
uso generalizado da de-
lação premiada na Ope-
ração Lava Jato desper-
tou, em definitivo, o interesse
de todos sobre o instituto. Como
lembrou em recente entrevista
no exterior a Presidente Dilma,
desde a Inconfidência Mineira
se conhece e se abomina a figu-
ra do delator por sua carga ne-
gativa de traição.
No Brasil, a disciplina da delação,
com o nome de colaboração pre-
miada, não é nova, pois aparece
em várias leis desde a década de
90: crimes hediondos (1990), cri-
me organizado (1995), crimes do
colarinho branco e crimes tributários (alteração em 1995), seqüestro (alteração em
1996), lavagem de dinheiro (1998) e tóxicos (desde a lei de 2002). Há uma regra ge-
ral de proteção para o réu colaborador na Lei 9807 de 1999 (artigos 13 e 14). Mais
recentemente, passamos a ter um amplo regramento da delação premiada com a
Lei 12.850 de 2013 (artigos 4º a 6º), que trata de organização criminosa.
O Brasil é signatário de convenções internacionais da ONU que recomendam o uso
da delação premiada para combate à organizações criminosas e à corrupção: Con-
venção de Palermo de 2000 e Convenção de Mérida de 2003. Há, internacional-
mente, o convencimento de que a delação é instrumento relevante e eficaz para
investigação e punição destas formas de criminalidade. O Juiz Sérgio Moro, em ar-
tigos publicados, cita como exemplo exitoso de investigação com uso da delação a
Operação Mãos Limpas, na Itália, sobre a Máfia. O mesmo magistrado diz que deve
se ressalvar que a palavra de criminoso colaborador deve sempre ser vista com des-
confiança, e que o depoimento deve ser amparado em prova de corroboração.
A própria lei de regência da delação premiada estabelece que nenhuma sentença con-
denatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colabo-
rador (artigo 4º, §16), o que indica que não se deve, desde logo, aceitar como verdade
tudo que um delator diz, sem a chamada prova de corroboração, isto é, documentos,
perícias e outras provas materiais que demonstrem a veracidade da delação.
Um dos requisitos da delação é que a disposição de colaborar seja voluntária e não
fruto de qualquer forma de coação. É fora de dúvida que prender investigados pre-
ventivamente e, depois, lhes oferecer a liberdade provisória ou a prisão domiciliar
em troca da delação premiada viola a voluntariedade do ato.
Outro problema é impor no acordo de delação premiada a renúncia do colabora-
dor a direitos fundamentais, previstos na Constituição e na Convenção Americana
de Direitos Humanos, que são irrenunciáveis, como o direito de acesso à Justiça, o
direito ao silêncio, o direito de não se autoincriminar e o direito de recorrer contra
sentenças desfavoráveis.
Cézar Roberto Bitencourt chama o instituto de traição bonificada, que critica, afir-
mando que aquele que é capaz de trair, delatar ou dedurar um companheiro movido
exclusivamente pela ânsia de obter alguma vantagem pessoal, não terá escrúpulos
em igualmente mentir, inventar, tergiversar e manipular as informações que ofere-
ce para merecer o que deseja.
Marcelo Leonardo, advogado
criminalista