Revista Ações Legais - page 122-123

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ARTIGO
Presunção de inocência
Por João Baptista Herkenhoff,
magistrado aposentado (ES) e escritor
E
rrou, data venia, o Supremo Tribunal Federal
ao admitir, em decisão recente, a prisão de um
acusado, logo após a condenação em segunda
instância. A votação esteve perto do empate (6 a 5).
Cedeu o Supremo à pressão de parte expressiva da
opinião pública. Não se sabe se essa parte que apoia
a linha dura é majoritária ou minoritária. Voraz certa-
mente é porque está alimentada pelo ódio.
Se o braço vingador tem apoio maior ou menor é ir-
relevante. As questões éticas e os grandes critérios
jurídicos não estão subordinados a percentuais de
aprovação ou reprovação popular.
Examinemos o tema sob o ângulo doutrinário.
Não existemeia presunção de inocência, relativa pre-
sunção de inocência, presunção de inocência condi-
cionada a isso ou aquilo. Presunção de inocência é
presunção de inocência, não admite pano morno.
Diz o artigo 5o, inciso LVII, da Constituição Federal:
“Ninguém será considerado culpado até o trânsito
em julgado da sentença penal condenatória.”
A interpretação literal, textual ou gramatical do pre-
ceito exige o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória para que alguém seja considerado cul-
pado. A sentença transita em julgado quando já não
mais se admite qualquer recurso.
O advérbio ninguém não tem sentido dúbio. Nin-
guém é ninguém. Todos os acusados estão ampara-
dos pela cláusula proibitória de admissão da culpa
antes do trânsito em julgado de sentença desfavo-
rável.
Estaremos rasgando a Constituição se admitimos
que Luís, José, João, Isabel, Maria ou Dilma, qualquer pessoa seja considerada culpada
antes de sentença final condenatória.
Hoje permite-se que José, Luís, Isabel ou Dilma seja considerada culpada antes do trânsi-
to em julgado da sentença desfavorável. Amanhã não será José, Isabel ou Dilma, pessoas
que não integram minha família, que sofrerá o ferrete da presunção de culpa, mas serei
eu mesmo o alvo. Como cidadão brasileiro, não estarei protegido pelo preceito.
Alémdo dispositivo constitucional claríssimo, há todo umarcabouço doutrinário emapoio
da presunção da inocência.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, em seu artigo XI, 1, dispõe: “Toda
pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a
sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual
lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”.
Em nosso Continente, a Convenção Americana dos Direitos Humanos (Pacto de São José
da Costa Rica) abrigou a garantia da presunção da inocência.
Desta forma, a presunção de inocência não é apenas um preceito do Direito brasileiro
mas tem a chancela da cultura jurídica universal.
“Ninguém será
considerado culpado até
o trânsito em julgado
da sentença penal
condenatória.”
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