ARTIGO
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Por Evandro A. S. Grili, advogado,
especialista em Direito Ambiental
que manter algo que já vigorava desde o ano passo.
Em termos jurídicos, quando nos deparamos com coisas deste tipo a primeira coisa que
vem à mente é a inabilidade do legislador e o completo desconhecimento daquilo que em
Direito chamamos de interpretação sistemática. Afinal, não se pode interpretar o art. 29 e
seus parágrafos de forma isolada. É preciso fazer a leitura do art. 78-A, do mesmo Código,
que diz o seguinte: “Após 31 de dezembro de 2017, as instituições financeiras só conce-
derão crédito agrícola, em qualquer de suas modalidades, para proprietários de imóveis
rurais que estejam inscritos no CAR”.
Ou seja, o prazo para o CAR volta a ter o limite fixado no art. 78-A. Os defensores do texto
poderão dizer que esse dispositivo só se aplica a quem busca financiamento para a pro-
dução. Mas aí estamos falando da quase totalidade da produção brasileira. Isso, sem con-
tar, que o próprio setor do agronegócio e órgãos do governo tem anunciado que só uma
pequena parte, cerca de 5%, das propriedades brasileiras ainda não teria se cadastrado.
Ora, então qual seria a razão para a edição de Medida Provisória desse tipo? Realmente,
é bastante estranho.
Os movimentos políticos já no dia seguinte da emissão da MP dão sinais de que ela vai ser
questionada no Supremo Tribunal Federal.
Aí podemos tirar outra leitura, mais política do que jurídica: após o Senado deixar ¨cadu-
car¨ dias atrás a MP 867, aprovada na Câmara, com alterações no art. 68 do Código Flo-
restal, ao que parece essa nova MP seria uma espécie de artifício para que os deputados
e senadores, durante a sua tramitação, pudessem apresentar emendas e ressuscitar a
discussão acerca da flexibilização das regras do Código Florestal.
Um caminho que vai levar a mais judicialização. Uma pena, pois acabamos de ver o STF,
em 2018, encerrar uma discussão que se arrastava desde 2012, quando o Novo Código foi
publicado. A Suprema Corte, por seu Plenário, decretou a constitucionalidade da nova
legislação florestal brasileira.
E, mais uma vez, ao invés de abraçarmos a nova lei e fazê-la sair do papel, estamos alte-
rando-se, mexendo em seu texto e já prevendo novas judicializações sobre o tema.
Vamos ficar atentos aos próximos passos e torcer para que possamos avançar nessa ques-
tão. Será bom para o meio ambiente, será bom para o setor produtivo, será bom para o
Brasil.