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ARTIGO
O lado negro das startups
*Por Pedro Schaffa
Pedro Schaffa, advogado
E
m menos de uma década, a palavra startup
saiu do desconhecido para ocupar uma posição
consolidada no senso comum de muita gente.
Quando se fala em digital, tecnologia ou empreende-
dorismo, você certamente vai cruzar com o conceito
que engloba as empresas em estágio inicial. Criado-
ras de soluções e facilidades, elas têm alterado as re-
lações socioeconômicas, mas, agora, começamos a
ver os problemas sofridos por esse modelo.
Como uma reação tardia a feroz (e por vezes cega)
difusão das startups, cada vez mais se pergunta: qual
o verdadeiro significado desse movimento? Por trás
de tantos ganhos e vantagens que essas empresas sustentam em seus discursos, onde
é que estão as perdas? Elas prosperam em um ambiente verdadeiramente sustentável?
Será que lá na frente vamos poder dizer que entre mortos e feridos, salvaram-se todos?
Muitas das questões só serão respondidas com o passar do tempo, mas, como sempre, a
história nos permite esboçar algumas conclusões. A primeira delas é que certas rupturas,
de fato, já foram consolidadas. Alguns projetos que se apoiam no “sharing economy”
(economia compartilhada) confirmam que a criatividade, o compartilhamento, a colabo-
ração e a sustentabilidade de fato impulsionam a uma revisão de processos, instituições e
tradições constituídas. Por exemplo, o Airbnb, que revolucionou o processo de ocupação
de domicílios e o Uber, mudando a cara do transporte público.
Do outro lado, há ummar de casos de insucesso, cujas histórias são varridas para debaixo
do tapete como se fosse essencial esquecer-se deles (e cujos responsáveis, curiosamen-
te, agora são coach e palestrantes de auto ajuda).
A HomeJoy, por exemplo, que intermediava trabalho doméstico nos Estados Unidos da
mesma forma como o Helpling o faz no Brasil. Promoveu ruptura, mas não conseguiu
seguir com as tão necessárias injeções de dinheiro e, por isso, fechou as portas. Entre as
justificativas que levaram o projeto ao fracasso está a falta de respaldo jurídico e o receio
de que a startup tivesse que assumir vínculos empregatícios com seus colaboradores.
Chega-se, portanto, à pergunta: quem vai vencer?
Como aconteceu na bolha da internet, algumas novidades terão vida longa e baterão de
frente com empresas tradicionais. A grande maioria não vai suportar o rigoroso inverno,
pois já nasceu velha, frágil e inadequada. É fundamental que o empreendedor brasileiro
saiba exatamente o tamanho, a profundidade e a escuridão do buraco em que está se
enfiando antes de se jogar de cabeça.
O primeiro ponto a se pensar bemquando se fala de startups brasileiras é que, até agora, nin-
guém sabe ao certo como ganhar dinheiro com elas. Todo mundo acha que ter participação
numa empresa é como comprar ações do Facebook quando ele era pequeno - você investe
mil reais e tira umbilhão de volta. Só que no Brasil são raríssimos os casos de startups que fo-
ram vendidas por valores altos e que retornaram uma quantia significativa para o investidor.
Além disso, dificilmente um acionista vai ganhar dinheiro só com dividendos (distribuição
de lucros), uma vez que a grande maioria dos projetos necessita de constante alavanca-
gem. Ou seja, a receita que entra é usada para continuar acelerando o negócio. Pelo me-
nos enquanto ele se mostrar viável.
Há milhares de investidores de primeira viagem que ganhariammuito mais aplicando seu
dinheiro na poupança do que na loteria das startups.
Outro ponto preocupante é a qualidade das empresas. Às vezes a ideia e o produto são
bons, mas a administração é temerária e, na grande maioria, a necessidade e a procura
pelo produto (normalmente aplicativos) é inexistente ou já existem competidores inter-
nacionais muito melhores.
São raros os casos de bons administradores, bemassessorados, combons investidores (que
não só tem dinheiro, mas conhecem a área em que se metem) e com bons produtos. O que
há muito é gente dando murro em ponto de faca até que o dinheiro da empresa se esgota
e o empreendedor precisa se socorrer com familiares e amigos para continuar seu sonho,
que nessa fase já é um pesadelo. E perde-se muito dinheiro sustentando essas ilusões.
O Brasil não tem (ainda) um impacto internacional relevante na área de tecnologia. Assim, em-
presasbrasileirasde tecnologia temque seprovarmaisdoqueempresasdeoutrospaíses. Além
disso, a cultura empresarial brasileira ainda é vista sob certa desconfiança no cenário internacio-
nal. Vide o constante desaparecimento de aceleradoras e investidores internacionais no país.
E por último, muito se ouve nesse mundo de startups que todos falham e que isso não é
problema, que você não só pode como deve quebrar uma, duas, três vezes até alcançar o
sucesso. Só que é importante saber que nem sempre o fracasso é um degrau na escalada
para o sucesso, às vezes ele é só mais um passo em direção ao abismo.