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ESPAÇO DAS LETRAS
ESPAÇO DAS LETRAS
Pompeia – a vida de uma cidade romana
Mary Beard, Editora Record, 420 páginas, R$ 64,90
Umacomunidadeformadaporapenasalgunsmilharesdehomens
e que tem um impacto ainda imensurável na narrativa da história
romana. Devastada por uma das maiores erupções do Vesúvio
em 79 d.C, Pompeia permanece no imaginário de pesquisadores,
arqueólogos e curiosos em geral. A literatura sobre a tragédia e
o povo, que vivia a cerca de 20 km de Nápoles, é farta e, em sua
maioria, afirma que a cidade foi congelada no meio do caminho.
Esta, no entanto, é justamente uma das principais ideias refutadas
pela especialista em classicismo Mary Beard no livro “Pompeia, a
vida de uma cidade romana”, que chega agora ao Brasil pela Edi-
tora Record.
Logo nas primeiras páginas da narrativa, a escritora relembra a fuga dos moradores e os si-
nais de alerta que o povo teria recebido horas ou dias antes da erupção. Em seguida, Beard
percorre as inúmeras descobertas encontradas nas escavações e revela curiosidades, como a
possibilidade de alguns dos esqueletos não pertencerem às vítimas do vulcão, mas serem de
pessoas que se arriscaram a voltar à cidade meses, anos ou séculos depois. Este é o caso, por
exemplo, de dois homens e uma criança encontrados comuma picareta e uma pá. Eles seriam
umgrupo de saqueadores soterrados pelas ruínas.
Por meio de centenas de ilustrações, mapas, plantas baixas e fotografias, a autora apresenta
no livro a vida de Pompeia nomundo antigo propriamente dito e a recriaçãomoderna da anti-
ga cidade. Os limites entre oque foi descoberto nas escavações, a porção da região ainda não
explorada e as alterações geográficas demarcadas para o turismo fazem com que a autora
não concorde coma ideia de que a cidade parou no tempo:
“É um lugar muitomais desafiador e instigante. Interrompida e perturbada, evacuada e pilha-
da, ela guarda as marcas (e as cicatrizes) de vários tipos de casos, que serão parte da história
deste livro e subjazem ao que podemos denominar o “paradoxo de Pompeia”: o de que, ao
mesmo tempo, sabemos muitíssimo emuito pouco sobre a vida antiga lá”,completa.
“Pompeia- a vida de uma cidade romana” inspirou a série “Pompeii: News Secrets Revealed
withMary Beard”, exibida no início deste ano pelo canal BBC One.
Trecho:
“Sob amontanha de pedras-pomes, foramdescobertos aproximadamente quatrocentos cor-
pos e quase setecentos nos restos sólidos do fluxo piroclástico – muitos deles vividamente
capturados no instante damorte pela técnica engenhosa, criada no século XIX, que preenche
com gesso o espaço deixado pela pele decomposta e as roupas, para revelar as túnicas arre-
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Intelectuais mediadores
Organização de Angela de Castro Gomes e Patricia Santos
Hansen, Civilizaçào Brasileira, 490 páginas, R$ 54,90
Ainda são poucos os estudos sobre mediação e mediadores
culturais e muitos são os questionamentos que permeiam este
campo de atuação. Um deles é a própria identificação dos pro-
fissionais da área como intelectuais. O tema é o fio condutor da
coletânea de artigos “Intelectuais mediadores”, que chega às
livrarias neste mês de julho pela Editora Civilização Brasileira.
Organizado pelas historiadoras Angela de Castro Gomes e Pa-
tricia Santos Hansen, o livro reúne 14 textos que refletem so-
bre a acepção tradicional do termo ‘intelectual’ e testam as potencialidades da categoria
‘intelectuais-mediadores’, fazendo frente, por exemplo, à dicotomia que hierarquiza duas
figuras envolvidas nos processos culturais: produtores/criadores e aqueles envolvidos na
recepção e no acesso aos bens culturais.
A obra chama atenção justamente para o fato de os criadores e produtores serem consi-
derados como integrantes da cultura erudita e provocadores de alterações profundas nos
ambientes artísticos, enquanto aos profissionais mediadores resta o estigma do vulgari-
zador, como se o profissional estivesse envolvido em uma esfera cultural, menos original,
científica e séria.
Com contribuições da antropologia e da sociologia, os autores analisam as práticas da cir-
culação e da apropriação de bens culturais e inserem tradutores, professores, guias, edi-
tores e outros profissionais da medicação cultural na mesma dinâmica de sentido e valor
do domínio da criação.
gaçadas, os rostos silenciados e as expressões sombrias das vítimas. [...]
Mas amorbidez nãoé tudo. O impacto causadopelas vítimas (estejamelas totalmente recom-
postas emgesso ou não) tambémprovémdo sentimento de contato imediato comomundo
antigo que elas oferecem, das narrativas humanas que nos permitem reconstruir e das esco-
lhas, decisões e esperanças de pessoas reais com as quais podemos ter empatia através dos
séculos. Nãoprecisamos ser arqueólogospara imaginar oque seriaabandonar as nossas casas
levando só o que conseguíssemos carregar.”
Mary Beard é uma das mais conhecidas classicistas da Grã-Bretanha. É professora da Univer-
sidade de Cambridge e editora consultiva de Antiguidade Clássica e História Antiga do The
Times Literary Supplement (TLS), alémdemanter o blog ADon’s Life, relacionado ao tema.