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ESPAÇO DAS LETRAS
ESPAÇO DAS LETRAS
Pelas Paredes,
Marina Abramović, tradução de Waldéa
Barcellos, Editora José Olympio, 416 páginas,
R$ 64,90
Aos 14 anos, Marina Abramović teve sua primei-
ra aula de pintura. Depois de atirar tinta sobre a
tela, o professor, um amigo de seu pai, acrescen-
tou um pouco de areia e pigmentos coloridos,
derramou gasolina, acendeu o fósforo, explodiu
a obra e disse ao final: “Isso é um pôr do sol”. A
experiência na adolescência teve papel marcante
em suas criações: “Ela me ensinou que o processo
era mais importante que o resultado, exatamente
como a performance significa mais para mim do
que o objeto”, conta em “Pelas paredes”.
Três anos após o episódio, Marina começou a se
preparar para entrar na Academia de Belas Artes
de Belgrado, já com a ideia de que poderia fazer
arte a partir de absolutamente qualquer coisa,
fosse fogo, água ou o próprio corpo. Em 1973,
apresentou em Edimburgo uma de suas primeiras
performances: Rhythm 10, que consistia em fincar
facas no espaço entre os dedos de uma das mãos o mais rápido possível, se expondo a quase ine-
vitáveis cortes.
De lá pra cá, foram inúmeros experimentos polêmicos com simbologias curiosas, como oferecer
objetos ao público, incluindo um revólver, para que fizessem o que desejassem com ela, correr e
se lançar de encontro a paredes, deitar em volta de uma área em chamas, dar a volta na Muralha
da China e a emblemática performance The artist is present, que levou cerca de 850 mil pessoas
ao MoMA em 2010. Além de ter sido uma retrospectiva do trabalho da artista, nesta última ação,
Marina se sentava frente a frente com os visitantes, provocando reações emocionadas pela sim-
ples troca de olhares.
Seu livro de memórias revela que a ousadia de sua produção artística é também a manifestação
de liberdade de alguém que veio de uma família extremamente rígida e que viveu em tempos som-
brios, numa ditadura comunista na Iugoslávia dos anos 1940 aos 1970. Sua mãe era major do exér-
cito e seu pai foi designado para a guarda de elite do ditador marechal Tito. Marina sempre teve
uma relação conturbada com a mãe, uma mulher culta e pouco afetuosa, e acabou se afastando do
pai após a separação do casal, reencontrando com ele apenas dez anos depois.
Entre as viagens relatadas no livro estão diversas passagens pelo Brasil, entre elas sua visita a xa-
mãs em Curitiba, ao médium João de Deus, conhecido mundialmente por suas atividades de cura,
e sua participação em ritos religiosos, alguns deles na Chapada Diamantina. Parte dessas experiên-
cias foram registradas no filme “Espaço Além: Marina Abramović e o Brasil.”
Os Lusíadas: The Lusiads, de Luís Vaz de Camões
Tradução de Richard Francis Burton, edição bilíngue
(português e inglês), Editora LandMark, 728 páginas, R$ 78,00
A Editora Landmark apresenta uma versão inédita no Brasil da
maior obra em língua portuguesa de todos os tempos. O livro
reúne o poema épico de Luís Vaz de Camões com a tradução
realizada em 1880 por Sir Richard Francis Burton, tido como
umdos grandes eruditos e tradutores britânicos de sempre.
Mais que uma obra literária, pode-se dizer que é uma obra
de arte, tal foi o empenho do autor em mantê-la com esta
regularidade formal. Considerado o maior poema épico da
língua portuguesa, foi publicado em 1572, como apoio do Rei
D. Sebastião. O poema narra as perigosas viagens marítimas
e a descoberta de novas terras, povos e culturas, exaltando o heroísmo do povo português,
que, navegador, aventureiro, cavalheiro e amante, é tambémdestemido e bravo, e enfrenta
mares desconhecidos em busca dos seus objetivos. É a epopeia portuguesa por excelência,
é a referência ou o livro-síntese da História e da singularidade de Portugal nomundo. É uma
síntese da História de Portugal, ao mesmo tempo em que narra a descoberta do caminho
marítimo para o Oriente por Vasco da Gama.
Além de narrar o caminho para a Descoberta das Índias, a epopeia é inspirada por obras
como a “Eneida”, de Virgílio e a “Odisseia, de Homero. Os navegantes são supervisionados
pelos deuses do Olimpo que decidem o destino dos navegantes após a realização de um
concílio: Os portugueses encontram em Vênus uma preciosa aliada e em Baco, o mais fer-
renho inimigo, que teme que a audácia portuguesa conquiste as terras de Índia, antes dedi-
cadas a ele e sobre o controle do deus. Camões descreve as grandes navegações, o império
português no Oriente, os reis e heróis de Portugal, dentre outros fatos que o tornam um
poema histórico e enciclopédico. Emseu Epílogo apresenta um lamento, que, ao deparar-se
coma dura realidade do reino português na época de D. Sebastião, já não consegue deslum-
brar novas glórias e conquistas no futuro e ressente-se de que a sua “voz enrouquecida”
não seja escutada commais atenção.
Sir Richard Francis Burton, aomesmo tempo umbrilhante linguista e aventureiro temerário,
bem como uma figura complexa e polémica, traduziu outras obras, entre as quais o “Kama
Sutra” (1883) e as “Mil e Uma Noites” (1885), cuja tradução causou frenesi entre os vito-
rianos devido a uma série de notas polémicas. Também o seu erudito “Ensaio Final”, onde
apresenta a história, os usos e os costumes, os princípios e a religião de vários povos, ajudou
a contribuir para ampliar a visão ocidental sobre os Oriente, além de relacioná-los com ou-
tras culturas.