Revista Ações Legais - page 42-43

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ARTIGO
Novas perspectivas nas
relações coletivas de trabalho
Por Paulo Sergio João, advogado e
professor
N
unca é demais tratar dos temas e dos conteúdos
transformadores que a reforma trabalhista trouxe
com as leis 13.429 e 13.467, ambas de 2017. A segun-
da lei, ao contrário da primeira, que foi pontual na modali-
dade trabalho temporário e prestação de serviços, foi mais
ampla e, necessariamente, obriga a todos que se dedicam
ao Direito do Trabalho estudo repetitivo e reflexões dos
seus efeitos para a construção de um novo paradigma de
entendimentos e de ajustes de interesses.
No âmbito das relações coletivas, a reforma se pauta na
mudança de princípio na interpretação de eventuais confli-
tos, devendo-se pautar nos requisitos essenciais do negó-
cio jurídico e no respeito à autonomia da vontade coletiva.
Com efeito, assim dispõe o artigo 8º, parágrafo 3º:
“No exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de
trabalho, a Justiça do Trabalho analisará exclusivamente
a conformidade dos elementos essenciais do negócio ju-
rídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei n° 10.406,
de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e balizará sua atua-
ção pelo princípio da intervençãomínima na autonomia da
vontade coletiva”.
No primeiro aspecto, ao contrário do que alguns comen-
tam, não se trata de impedir a análise do negociado pelo
magistrado, mas de respeitar os interesses manifestados
pelo grupo em assembleia e que autorizaramo sindicato a
negociar emseunomecondiçõesnormativasque seaplica-
riam ao grupo. Trata-se de prestigiar o Direito Coletivo do
Trabalho, cujos princípios divergem da proteção existente
na relação individual de trabalho e atendemà proteção so-
cial do grupo. Esse aspecto transformador do Direito Co-
letivo do Trabalho deve ser prestigiado com atribuição de
responsabilidade ao sindicato que tema representação da
categoria (respeitando nosso modelo de organização sin-
dical) ou grupo de trabalhadores.
Os exemplos trazidos pela doutrina para criticar o texto le-
gal fazem caricatura lastreada na imagemde um sindicalis-
mo fraco e cúmplice de ilegalidades. Assim, não seria crível que sindicatos profissionais e patronais
ou empresas negociassemexclusões de direitos fundamentais como a exclusão de licençamaterni-
dade oumesmo férias anuais. Aliás, o artigo 611-B traz a proibição expressa de exclusão dos direitos
ali relacionados nos incisos I a XXIX.
Depois, ao considerar o texto do parágrafo 3º que seja respeitado o artigo 104 do Código Civil, está
atendendo aos princípios do Direito Coletivo do Trabalho cuja representação dos trabalhadores
por meio de sindicato exclui o critério de desigualdade econômica previsto na relação individual,
este simcapaz de fazer crescer a proteção individual. A referência diz respeito às relações coletivas
cujas condições de admissibilidade quanto à capacidade do agente, licitude do objeto e a forma do
ato jurídico tratam da (i) representação sindical (ou representatividade em modelos de organiza-
ção sindical plúrima), (ii) conteúdo de natureza trabalhista e de proteção social de natureza cole-
tiva e o (iii) documento de celebração do ato, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.
A capacidade jurídica e fática do sindicato não se faz apenas pela representação formal, mas pela
legitimidade adquirida e outorgada pelos representados por meio de assembleia destinada especi-
ficamente para o objeto da negociação. Portanto, emmatéria de Direito Coletivo do Trabalho, não
se admitiria a aventura da representação sem legitimidade, e esse aspecto impõe aos sindicatos
maior responsabilidade perante os representados de forma imediata e segurança jurídica nas rela-
ções trabalhistas, o que excluiria discussões em nível de ações individuais que contestem o nego-
ciado.
Quanto ao objeto da negociação, há que se considerar que, assegurados os direitos fundamentais
dos trabalhadores, não pareceria razoável imaginar conteúdos negociados para pretender a exclu-
são social. A liberdade emnegociar poderá surpreender com adaptações e avanços em conquistas
de direitos sociais, sempre preservando a base de garantias, conforme dispõe o artigo611-B, da CLT.
Finalmente, quanto à forma, em Direito Coletivo do Trabalho, conhecem-se duas modalidades: a
Convenção Coletiva de Trabalho e o Acordo Coletivo de Trabalho, cada um limitado a seus efeitos
e obrigações respectivas. Neste caso, as convenções coletivas tenderão, na nossa avaliação, a ser
normas de caráter geral, e os acordos coletivos de trabalho poderão ganhar relevância commaior
integração dos trabalhadores nos seus interesses coletivos e na empresa.
Outro aspecto relevante nas perspectivas do Direito Coletivo do Trabalho foi a adoção do critério
facultativo da contribuição sindical e que poderá produzir uma transformação no modelo de orga-
nização sindical por categoria. Assim, a busca desenfreada que tivemos pós-Constituição Federal
de 1988 no desmembramento de categorias, com nítido interesse econômico, poderá retroagir
para a revisão na forma de organização de grupos e, quiçá, com abandono da estrutura por meio
de categoria, facilitando a negociação pelo conjunto de trabalhadores na empresa, semse falar em
categoria preponderante, estabelecendo igualdade de tratamento entre os trabalhadores.
São aspectos relevantes do Direito Coletivo na sua perspectiva diante da reforma trabalhista, cuja
reflexão merece a atenção, a fim de que não se pratique o novo com os vícios do passado.
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