Revista Ações Legais - page 88-89

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Por Edson Vismona, presidente do
ETCO – Instituto de Ética Concorrencial
e do FNCP – Fórum Nacional Contra a
Pirataria e a Ilegalidade
concorrencial básica. Este aspecto inclusive deve ser objeto de uma reflexão profunda
dos nossos governantes: se as agências reguladoras – todas elas, sem exceção, Anac,
Anatel, ANP, Aneel, Anvisa, INMETRO, etc – não conseguem realizar a contento as suas
atividades, precisa ser imediatamente revista essa atuação reguladora, reforçando a ação
fiscalizadora, fortalecendo a postura eminentemente técnica e o aumento dos recursos
financeiros destinados para essa ação.
E o que na prática significa a concorrência desleal? Quais são as suas consequências? No
final do processo, temos dois mercados paralelos: o que se pauta pela legalidade e o pu-
ramente ilegal, construído a partir da sonegação de impostos e tributos, do contrabando
de produtos do exterior – vendidos sempre com margens estratosféricas de lucro -, da
falsificação e da pirataria. Quem burla as regras acaba lesando o consumidor: o cigarro
que vem do Paraguai não passa pelas exigências mínimas da Anvisa para este tipo de
produto; o mesmo ocorre com os medicamentos e produtos relacionados à saúde e lâm-
padas, eletrodomésticos e brinquedos que não atendem aos regulamentos do INMETRO.
Exemplos como esses são reais e afetam cadeias de produção inteiras em evidentes pre-
juízos à saúde dos brasileiros, à leal concorrência e ao erário. No caso do cigarro, que é o
produto mais contrabandeado do Brasil, por exemplo, as perdas com a sonegação fiscal
chegaram a quase R$ 10 bilhões em 2017.
Além da sangria nos cofres públicos, as empresas que trabalham na legalidade são dire-
tamente afetadas e precisam se ajustar a esta realidade: em outras palavras, o mercado
ilegal, livre e sem respeitar quaisquer regras, afasta investimentos, tira empregos e renda
dos brasileiros, afetando diretamente a geração de riqueza no país.
O grande nó da questão é que a fiscalização do mercado ilegal é muito deficiente, situ-
ação piorada pelo excesso de alterações e novas normas, que traz insegurança jurídica,
pode modificar as jurisprudências dos tribunais, gerando muitas dúvidas na condução
dos negócios. Já seria difícil fiscalizar um ambiente de regras claras e perenes, o que dizer
de uma situação em que as regras mudam sempre e o tempo todo?
Para entrar na trilha do desenvolvimento sustentado, o Brasil não precisa de leis novas
a todo instante, necessita muito mais de tranquilidade institucional e controles rígidos,
maior fiscalização do que já vigora. O mercado legal e o consumidor brasileiro merecem
respeito.
ARTIGO
A lei não é para todos
U
m estudo realizado pelo Instituto Brasileiro
de Planejamento e Tributação, com dados
até o dia 30 de setembro de 2016, revela que
União, Estados e municípios editaram 5,47 milhões
de normas desde a promulgação da atual Constitui-
ção Brasileira, em 5 de outubro de 1988. Pode pare-
cer incrível, e é: para que o leitor tenha uma ideia do
volume que isto representa foram 535 leis, decretos,
medidas provisórias, normas complementares ou
emendas editadas por dia, emmédia. O levantamen-
to aponta ainda que, no período analisado, a União
editou 163 mil normas, os Estados 1.460.985 e os mu-
nicípios, 3.847.866.
Este verdadeiro afã de regulamentar tudo e todos
trazemalgumas consequências importantes e graves
para o país. Por um lado, a verdade é que uma par-
te do mercado se adapta e segue as leis, decretos e
normas. Todas as empresas sérias naturalmente pro-
curam se informar para obedecer aos regulamentos
vigentes, ainda que isto gere custo, inclusive. Não é
coincidência que no Brasil as empresas são as cam-
peãs mundiais em horas dispendidas para o atendi-
mento das exigências fiscais: 2.600 horas!
Outra parte do mercado, o ilegal, no entanto, sim-
plesmente ignora o Estado, os decretos, leis, normas
técnicas - e ignora solenemente, semqualquer receio
das consequências que esta postura pode acarretar.
E por que a falta de receios? A resposta é simples: o
poder público não tem uma estrutura fiscalizatória
que dê conta de controlar este emaranhado de legis-
lações - aliás, parte delas conflitantes entre si.
Com isto, cria-se uma distorção sistêmica grave:
quem obedece a legislação tem uma desvantagem
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