Revista Ações Legais - page 94-95

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Por Thiago Assunção, mestre em
Educação para a Paz e professor de
Direito e Relações Internacionais
derá refúgio para aqueles que saíram da Venezuela, sem serem perseguidos por algum
dos motivos previstos em lei, mesmo o Brasil tendo adotado a definição ampliada que
permite a concessão de refúgio devido a grave e generalizada violação dos direitos huma-
nos. A solução encontrada pelo governo foi conceder residência temporária de até dois
anos para esses migrantes, via resolução. Para ter direito à residência, os venezuelanos
devem apresentar pedido de desistência da solicitação de refúgio. Porém, a solução mais
adequada, hoje, seria o visto ou residência para fins de acolhida humanitária, previstos
na nova Lei Migratória. No entanto, o decreto que regulamenta a Lei é lacônico quanto
a esta modalidade, dependendo de ato conjunto dos ministérios da Justiça, Relações Ex-
teriores e Trabalho.
Por fim, observa-se que o governo federal adotou algumasmedidas para enfrentar a ques-
tão em Roraima, como apoio para assistência humanitária, aumento do patrulhamento
nas fronteiras, e um projeto de “interiorização”, pelo qual os venezuelanos seriam enca-
minhados para outros Estados. Se a ideia for “despachar” as pessoas para outros lugares,
sem infraestrutura adequada para recebê-los, e apoio para integração ao mercado de
trabalho, a medida tem tudo para repetir o fiasco do caso dos haitianos enviados do Acre
de ônibus para o centro de São Paulo. Além do visto de acolhida humanitária, a solução
passa por uma vigorosa coordenação política entre autoridades municipais, estaduais e
federais, com participação da sociedade civil e do setor privado, de modo a criar condi-
ções para a recepção digna dessas pessoas, honrando a trajetória que foi se construindo
juridicamente nos últimos anos, de hospitalidade para commigrantes vítimas de conflitos
armados, desastres naturais e outras calamidades.
ARTIGO
Venezuelanos, lei
migratória e hospitalidade
D
esde que as condições de vida se deteriora-
ram na Venezuela, muitos venezuelanos co-
meçaram a deixar o país. Pela proximidade
geográfica e cultural, o Brasil tem sido o segundo
maior destino de fuga dos venezuelanos, atrás ape-
nas dos EUA. O governo federal tardou a responder a
esse súbito aumento da demanda, considerando que
a competência sobre o controle das fronteiras e ges-
tão da política migratória é de âmbito federal. Ocor-
re que o Brasil ainda não possui política migratória. O
que há é uma nova Lei de Migração (Lei 13.445/2017)
que, após longa tramitação, criou um marco legal
mais atual, baseado na proteção dos direitos huma-
nos dos migrantes e, finalmente, livre do autoritaris-
mo e burocracia da legislação anterior. A Lei foi regu-
lamentada, no entanto, por um decreto repleto de
falhas, que possui dispositivos, inclusive contrários à
própria lei que visa regulamentar - como é o caso da
prisão por razões migratórias, vedada expressamen-
te pela Lei.
A questão é que a maioria dos venezuelanos que en-
tra no Brasil por Roraima busca trabalho imediato,
justamente para encontrar uma forma de sustento.
Mas como eles não podem trabalhar com visto de tu-
rista, a saída encontrada foi solicitar refúgio, como os
haitianos, anos atrás. Assim, essas pessoas obtémum
protocolo provisório, podendo expedir documentos
e trabalhar legalmente no país, enquanto aguardam
a decisão sobre o refúgio. Ocorre que dificilmente o
CONARE – Comitê Nacional para Refugiados conce-
1...,74-75,76-77,78-79,80-81,82-83,84-85,86-87,88-89,90-91,92-93 96-97,98-99,100-101,102-103,104-105,106-107,108-109,110-111,112-113,114-115,...
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