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ARTIGO
Precisamos de vontade de
Constituição
Marcos Augusto Maliska, procurador
federal e professor de mestrado em
Direitos Fundamentais e Democracia
E
m A Força Normativa da Constituição, texto
clássico do constitucionalismo traduzido para
o português pelo atual Ministro do STF Gilmar
Mendes (Ed. Fabris, 1991), o Professor alemão Kon-
rad Hesse (1919-2005) escreve que não é “em tempos
tranquilos e felizes que a Constituição normativa se
vê submetida à sua prova de força”. Acrescenta que
“os interesses momentâneos não logram compensar
o incalculável ganho resultante do comprovado res-
peito à Constituição, sobretudo naquelas situações
em que a sua observância revela-se incômoda”. Enfa-
tiza ainda o saudoso Professor de Freiburg e Juiz do
Tribunal Constitucional Federal Alemão: “Pode-se afirmar que a Constituição converter-
-se-á em força ativa se fizerem-se presentes, na consciência geral – particularmente, na
consciência dos principais responsáveis pela ordem constitucional –, não só a vontade de
poder, mas também a vontade de Constituição”.
Omomento atual é, comcerteza, amaior prova de força da normatividade da Constituição
brasileira de 1988, um texto que desde a sua promulgação vive em permanente tensão
com a realidade. O impeachment, um instituto previsto na carta maior para apurar crime
de responsabilidade cometido pelo Presidente da República, é hoje lido em perspectivas
completamente distintas. De um lado, se argumenta a legitimidade constitucional do ins-
tituto e a normalidade do processo. De outro, que não há crime de responsabilidade, que
o processo possui vícios e que o seu uso ilegítimo transveste-se de um meio com o obje-
tivo de derrubar a Presidente.
A Constituição, como diz Hesse, depende particularmente da vontade de seus principais
responsáveis. Sem ela, o texto maior perde a sua força própria e passa a ser classifica-
do como “Constituição Nominal” ou “Semântica”. A democracia em sociedades plurais,
marcadas por profundas divergências, somente sobrevive se houver um consenso mí-
nimo entre os grupos sociais acerca das regras do jogo, ou seja, acerca da Constituição.
Quando não há consenso sobre essas regras básicas, a democracia encontra-se em risco,
pois há a real possibilidade de não mais se considerar a Constituição como o instrumento
que disciplina a vida política do país.
Desta forma, a legitimidade do uso do poder não está no discurso daquele que o de-
tém, mas sim no seu reconhecimento pelo povo, o verdadeiro titular da soberania. Qual-
quer medida que se afastar dessa premissa irá, infelizmente, contribuir para um enorme
retrocesso no processo de implantação de um Estado Democrático de Direito entre nós.
Agora é o momento, mais do que nunca, de se ter vontade de Constituição.
“A democracia em sociedades
plurais, marcadas por profundas
divergências, somente sobrevive
se houver um consenso mínimo
entre os grupos sociais acerca
das regras do jogo”
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