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ARTIGO
Ouro de tolo, voto de bobo
Por Paulo César Régis de Souza, vice-
presidente da Anasps
O
s alquimistas da Idade Média prometiam trans-
formar chumbo em ouro. Os alquimistas de hoje
prometem transformar bitcoin, sem lastro mo-
netário, emmoeda virtual ou bolha.
Nosso ilustre presidente Michel Temer faz o mesmo com
nossos parlamentares.
Juntamente com nosso competente ministro da Fazen-
da, promete melhorar a economia do país, acabar com a
violência, melhorar a segurança e a educação, salvar os
doentes, proteger os mendigos, tudo isso se os deputa-
dos e senadores aprovarem a sinistra reforma da Previ-
dência Social.
Promete cargos, que não tem, mas vai criar.
Promete pagar as emendas para a construção de estra-
das, escolas, hospitais, creches, coretos, colocação de si-
naleiras, lombadas e pardais.
Promete recursos para as falidas Universidades Federais,
semdinheiro para pesquisa, inovação e desenvolvimento
científico e tecnológico.
Promete acabar com as dívidas dos estados e municí-
pios, perdoando as do INSS, do FGTS, do Ibama, da Co-
fins e da CSLL.
Promete evitar o fechamento das santas casas e criar
mais leitos em unidades púbicas de saúde.
Prometeu tudo isso e nas duas vezes em que foi acusado
de corrupção e precisava de votos para se salvar de ser
cassado e levado ao cárcere - ele que lidera umMinistério
recheado de corruptos de grosso calibre.
Prometeu e levou os bobos, deram seus votos a troco de
migalhas, restos, verbinhas que alimentam os pequenos
roedores, cargos para alguns familiares, amigos, poten-
ciais, delatores.
Agora, na famigerada reforma da Previdência, Michel Te-
mer, assim como Raul Seixas, promete dar aos bobos um disco voador para uma linda e segura
sociedade alternativa, com uma metamorfose ambulante.
Tudo para reformar a Previdência e jogar 95 anos de Previdência Social pública na lata do lixo, le-
var 65milhões de segurados contribuintes ao pântano de contribuir por 40 anos para ter direito ao
teto do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, ou sair commenos de dois salários, desestrutu-
rar as vidas de 28 milhões de segurados beneficiários, 18 milhões de urbanos e 10 milhões de rurais
- que não contribuíram, liquidar coma esperança e o sonho de gerações de brasileiros, implantar o
terror e a incerteza na Previdência e arrastar à miséria ao infortúnio e a falência 70% dos municípios
que vivem às custas da Previdência.
Se querem reformar, se é preciso e inadiável reformar, façam com quem entende: os servidores
do INSS. Previdência não se aprende na escola, mas ao longo dos anos na melhor escola da cultura
previdenciária.
NO RGPS, se querem acabar com o déficit, reformem o rural deficitário até a raiz, façam o agrone-
gócio pagar sua parte e sua dívida com o campo, acabem com as renúncias, as desonerações, os
Refis, cobremos caloteiros, executemas dívidas administrativa e ativa, paremcomos favorecimen-
tos a clubes de futebol, as pilantrópicas, MEI, Simples, segurados especiais, santas casas etc.
O rombo do INSS tem dono: a previdência rural. Abrir 2018 com R$ 150 bilhões de déficit. Isso eles
não dizem.
Quanto ao rombo da União, Estados eMunicípios, do Executivo, Legislativo, Judiciário eMinistério
Público, a reforma passa longe. O rombo é causado pelos brasileiros mais iguais do que os outros
e pelos ministros, incluídos no rombo e excluídos da Previdência. Os bobos nem sabem do que se
trata. E aí está o problema identificado pelo Banco Mundial.
O problema da Previdência é de gestão, de governança, de compliance. Michel Temer inaugurou
uma Previdência sem cérebro e sem alma, mal administrada, entregue na sua interinidade a pes-
soas sem o menor comprometimento com o social, com a Previdência, com o RGPS, com o INSS.
Gente que só entende de orçamento fiscal e jogou os trilhões da Previdência para sustentar o défi-
cit público.
SemMinistério, sem ministro, retalhado entre o céu e o inferno, com os auditores na Fazenda, os
procuradores na AGU, peritos guiados por Esculápio, os demais servidores sempai e semmãe, filas
virtuais e presenciais nas unidades que têm servidores, pois em muitas delas não os há - 15 mil já
poderiam ter saído, como já mostrou o TCU, mas não o fazem por amor a uma instituição com 95
anos de serviços prestados a várias gerações de brasileiros, seguramente cinco ou seis!
A Previdência está ferida de morte, ilhada, abandonada, humilhada.
Lembrem-se senhores parlamentares, não deem a ele o voto de bobo, pois certamente receberão
o ouro de tolo. Quem viver verá.