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Novo entendimento do
STF e a punição pelo não
recolhimento de ICMS
R
ecentemente, o Superior Tribunal de Justiça
(“STJ”) pôs fim a uma divergência existente
entre as suas Turmas: se haveria tipicidade
(e, logo, crime) na conduta do contribuinte que,
mesmo declarando, não efetua o recolhimento do
ICMS incidente em operação própria.
Em seu fundamento, o STJ entendeu que o contri-
buinte de direito (pessoa que realiza a circulação
de mercadoria) acaba por repassar o ônus tributá-
rio ao consumidor final (contribuinte de fato). Nes-
te sentido, segundo a tese do STJ, o não repasse
do ICMS “cobrado” do consumidor final configura-
ria o crime de apropriação indébita.
Contudo, ao nosso entender, tal decisão afronta
não só os direitos e garantias individuais, mas tam-
bém a própria lógica jurídico-tributária, adentran-
do no campo das relações privadas para dar con-
ceituação diversa ao faturamento das empresas. O
novo posicionamento do STJ é no sentido de que a
renda gerada na consecução das atividades empre-
sariais não é da empresa, mas sim de pessoa estra-
nha a sua relação: o Fisco.
Diferentemente ocorre na sistemática de substitui-
ção tributária, quando o substituto tributário realiza a cobrança do imposto incidente
nas etapas subsequentes, encerrando a cadeia de tributação de determinado produ-
to. Neste caso, os valores retidos a título de substituição tributária não integram o
patrimônio da empresa, tratando-se de uma verdadeira antecipação da receita tribu-
tária do Fisco.
No que tange ao direito penal, são muitos os problemas decorrentes de tal decisão,
como a ausência de dolo e a utilização indevida dessa ciência para fins meramente
arrecadatórios.
Sobre o primeiro ponto, é essencial salientar que, no momento em que o empresário
informa ao Fisco o imposto devido, deixa clara sua intenção de adimplir com tal mon-
tante, vindo, na maioria dos casos, a faltar com esse dever por motivos de impossibili-
dade financeira. Sabe-se que o dolo essencial à configuração da apropriação indébita
é o de reter para si coisa alheia, sendo tal conduta absolutamente incompatível com
a entrega de declaração própria a respeito da dívida, o que já deixa clara a intenção
de fazer o repasse.
A respeito do segundo ponto aventado, a decisão colabora com o chamado expan-
sionismo penal e com o uso simbólico dessa via sancionadora, que corresponde a um
direito penal feito para não ser aplicado, com prevalência de funções ligadas à sua
simbologia que à sua real efetividade, no sentido da crítica já existente em relação ao
direito penal ambiental. O uso da via penal para aumentar a arrecadação tributária
contraria frontalmente os princípios da ultima ratio, da subsidiariedade e da fragmen-
tariedade dessa ciência, desvirtuando, portanto, seus fundamentos mais ínsitos.
Espera-se que o próprio tribunal possa rever em breve esse posicionamento, ou, ain-
da, que a matéria seja levada com a máxima urgência à apreciação do Supremo Tribu-
nal Federal.
Por Chiavelli Facenda Falavigno,
professora e advogada da área de
Direito Penal
Por Marcos Lázaro, advogado
especialista em Direito Tributário