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A flexibilização da
interpretação do art. 1015
em desconformidade com a
ideologia do CPC de 2015
O
artigo 1.015 do Código de Processo Civil vi-
gente dispõe sobre o cabimento do recurso
de agravo de instrumento, sendo relativo ao
artigo 522 do Código de 1973. A nova redação do dis-
positivo trouxe mudanças essenciais com relação a
sua forma, prazo de interposição e, especialmente,
ao seu cabimento.
A título recordativo, no Código anterior duas eram
as modalidades de agravo possíveis em face de de-
cisões interlocutórias: o retido e o de instrumento.
Nesta época, o agravo de instrumento apenas tinha
cabimento quando se tratasse de decisão suscetível
de causar à parte lesão grave e de difícil reparação,
bem como nos casos de inadmissão da apelação e
naqueles relativos aos efeitos em que a apelação era
recebida. Não fossem estes os casos, o agravo ficaria
retido nos autos para julgamento pelo Tribunal ape-
nas quando do julgamento do recurso de apelação,
interposto em face da sentença.
Vale dizer que a cultura neste cenário era a de inter-
posição do recurso de agravo de instrumento em
toda e qualquer circunstância, afinal, ninguém tinha
a intenção de esperar até o fim do processo para ver
julgada uma matéria que poderia interferir em seu
curso integral. Desta forma, não eram poucas as ve-
Por Lorena Fade, advogada
zes que, ainda que não se tratasse de decisão suscetível de causar à parte efetiva lesão
grave ou de difícil reparação, optava-se por esta modalidade recursal, adequando-se de
alguma forma as razões de interposição a este critério. Ou seja, o cabimento do agravo
de instrumento tinha limitações, porém muito genéricas, que acabavam deixando muito
espaço aos advogados para dele se utilizarem (ainda que não cabíveis), abarrotando ain-
da mais os Tribunais de recursos a serem apreciados.
Com a entrada em vigor do Código de 2015 a figura do agravo retido deixou de existir e
criou-se, a princípio, um rol taxativo para a interposição do recurso de agravo de instru-
mento: apenas naquelas situações específicas elencadas no Código em vigor ou apenas
com relação àquelas matérias (e outras poucas exceções) é que o recurso seria conheci-
do, o que limitou a sua utilização e possibilitou ao Tribunal uma triagem muito mais práti-
ca e eficiente.
Parece-nos claro que ideologia do Código de 2015 foi limitar o uso deste recurso e aprimo-
rar a celeridade e eficiência processual.
Contudo, ao julgar os Recursos Especiais 1.696.396 e 1.704.520 em sede de repetitivo, em
meados de dezembro de 2018, o STJ (por maioria de votos - 7 x 5), ao julgar Recurso Re-
petitivo, entendeu por relativizar referido dispositivo legal, afastando a sua taxatividade
para interpretá-lo de forma extensiva ou analógica às hipóteses listadas. Ou seja, o rol do
artigo passou a ser meramente exemplificativo.
Entendeu a Ministra Nancy Andrighi, relatora dos recursos, que “sob a óptica da utilida-
de do julgamento revela-se inconcebível que apenas algumas poucas hipóteses taxativa-
mente arroladas pelo legislador serão objeto de imediato enfrentamento.” Da leitura do
acórdão, extrai-se que o principal fundamento para a adoção da interpretação extensiva
é o periculum in mora decorrente de decisão proferida em primeiro grau não recorrível
de imediato (mas apenas em sede de preliminar de apelação), capaz de tornar inútil a
apreciação do tema posteriormente.
Em que pese verificada ser boa a intenção da Corte, a tese fixada nos remete, automatica-
mente, à sistemática do Código de Processo Civil de 1973, em evidente retrocesso. A sub-
jetividade com que – novamente - será analisado o cabimento do agravo de instrumento
causa insegurança jurídica, morosidade ao trâmite recursal e distancia-se totalmente da
vontade (conscientemente adotada) do legislador.