ARTIGO
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Sem pretender insinuar que as garantias constitucionais sejam atropeladas, a responsabi-
lidade ambiental civil é objetiva, o que vale dizer que independentemente de culpa, a Vale
deve indenizar o dano causado ao meio ambiente e aos que foram afetados. O Código
Civil estabelece:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado
a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos
casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor
do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Conseguimos realizar prodígios atualmente que somente poderiam ser concebidos na ficção
científica, mas individualizar os danos causados pelo rompimento da barragem parece ser
algo de extrema dificuldade, senão, impossível para a Vale e outros atores envolvidos.
Dirão alguns que na esfera administrativa a aplicação de multas de valores astronômicos ser-
virá para punir e educar o infrator para que não cometa mais a infração ou, ao menos, pense
duas ou três vezes antes de cometer novamente. Risível. Após três anos do rompimento da
barragem emMariana, a Samarco, que foi punida commultas que somam R$ 350,7 milhões,
insiste em recorrer e não pagar. Na esfera penal a toada é mesma. Não houve condenação e
os processos repletos de pedidos de nulidades e recursos que impedem que os afetados e a
população, de modo geral, experimente aquilo que o Ministro da Justiça, Sergio Moro, cha-
mou de "sensação de segurança" ao apresentar o pacote de medidas em segurança pública.
É claro que não se espera que as garantias constitucionais dos acusados não sejam respeita-
das, mas, justiça tardia não é justiça.
Questiona-se a promiscuidade entre empresas mineradoras e as empresas certificadoras.
Não se encaixaria no conceito de organização criminosa? Parece ser o caso, assim, teríamos
a possibilidade da delação premiada, o que poderia auxiliar, como tem auxiliado, nos casos
da Operação Lava Jato, as condenações e cumprimento de penas por pessoas antes "intocá-
veis" pelas leis.
O problema não é que não tenhamos no Brasil leis e mecanismos para lidar com situações
como as deMariana e Brumadinho, mas que eles sejamaperfeiçoados a partir de eventos trá-
gicos como estes. Aprenderemos com eles ou teremos que continuar a conviver com a sen-
sação de insegurança, torcendo para que não aconteça coma barragemperto de nossa casa?
Por Douglas Castro, advogado,
professor, pós-doutor em Direito
Internacional Econômico e doutor em
Ciência Política - Relações Internacionais