ARTIGO
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Se uma for estruturada para ter função econômica de fundo de investimento (seja ou não de
venture capital), será tributariamente ineficiente a ponto de tornar proibitiva a utilização des-
te tipo de veículo de investimento em território nacional.
A solução encontrada, então, foi de não se utilizar pessoas jurídicas para tanto. AComissão de
Valores Mobiliários ("CVM") baixou normativos que determinam serem os fundos de investi-
mento verdadeiros condomínios, que não são tributados como as pessoas jurídicas normal-
mente o são. Assim, seriam "tributariamente neutros".
Uma soluçãobastante engenhosa, que resolveudemaneira aparentementebrilhante a inade-
quação de nossa legislação tributária. É uma solução societária para um problema tributário.
Contudo, é verdadeiro remendo que criou outro problema: condomínios, nos termos da
legislação brasileira, não têm como característica intrínseca a limitação da responsabilida-
de dos investidores.
Em outras palavras, não servem para delimitar os riscos que os investidores enfrentam ao in-
vestir nos fundos. Então, por serem condomínios, fazem que seus condôminos (os cotistas)
carreguem consigo o risco de terem de assumir para si todo o passivo do fundo.
Agora entra em cena a MP 881, que institui a chamada "Declaração de Direitos de Liberdade
Econômica" para estabelecer "normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de ati-
vidade econômica".
Apesar de estar longe de ser perfeita, traz dispositivo importantíssimo para lidar com o pro-
blema da ilimitação da responsabilidade dos investidores em fundos de investimento.
Amedida é bastante importante no que diz respeito ao fundos de venture capital, pois o índi-
ce de mortalidade das startups que recebem investimentos de tais fundos é altíssimo, sendo
extremamente importante impor-se limite às possibilidades de perdas, para que os riscos se-
jam adequadamente mensurados.
AMP 881 insere novo artigo no Código Civil, de número 1.368-C. Tal dispositivo cria legalmen-
te a categoria de fundos de investimento na forma de "condomínio de natureza especial" (já
que os normativos editados pela CVM não possuem força de lei), de acordo com a redação
dada pelo Congresso Nacional nos termos do Projeto de Lei de Conversão nº 17/2019.
Mas, tão importante quanto isso, o referido dispositivo tambémpermitirá que os regulamen-
tosdos fundosde investimentona formade"condomíniodenaturezaespecial" tenhamcomo
característica "a limitação da responsabilidade de cada investidor ao valor de suas cotas".
Tal medida é essencial para o desenvolvimento do mercado de fundos de venture capital e
permitirá que sejamfeitosmais investimentos commuitomais segurança. É verdadeiro incen-
tivo bem-vindo em nosso mercado e mais iniciativas deste estilo devem ser implementadas.
Por Marcelo Godke, advogado, professor
e mestre pela Universiteit Leiden
(Holanda) e Columbia University