Revista Ações Legais - page 24-25

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O princípio dramático da
gratuidade judiciária
H
á aqueles, como o ministro Marco Aurélio
Mello, do Supremo Tribunal Federal-STF, que
sustentam que nenhum ônus deveria incidir
sobre os processos judiciais. Os tributos que reco-
lhemos, sem retorno e sem esclarecimentos, o jus-
tificaria.
Entretanto, além desse argumento, há outros, que
não pendem em favor da universalização da justiça
gratuita. As lides seriam ainda mais profusas, em um
País pobre cujo povo é inclinado a brigar por nona-
das. Enfarta-se o aparelho judiciário. Afora, a gratuidade é um estímulo às aventuras:
juntamente com o advogado, a parte tenta, como num jogo qualquer, com a diferença
- pior - de que os jogos são onerosos.
Não convêm licenciosidades, num País de liberdades. Portanto, cremos que a jurisdição
civil deva ser paga, embora não nos parâmetros abusivos das atuais custas processuais,
especialmente no Estado em que haurimos experiência - São Paulo. "In medius virtus".
Porém, discordamos de alguns pontos do art. 98 e seguintes do atual - já não tão novo
- Código de Processo Civil, que disciplina a matéria. Ao lado de o Estado dispensar o
que é dele, dispensa também o beneficiário do pagamento dos honorários advocatícios
devidos por ele, se vencido numa demanda (inciso VI).  Doação com o chapéu alheio.
Se o Estado pode dispensar o que é seu, não poderia dispensar o que é do advogado
vencedor do conflito. Honorários que são "essencialia vitae" - natureza alimentar - as-
sim como o benefício busca evitar o ajuizamento sem prejuízo da alimentação própria e
da família, embora este requisito não esteja explícito no Código vigente, diversamente
do que estipulava o revogado. Afinal, o advogado vencedor trabalhou, e proficuamen-
te, tanto que foi vencedor. É certo que o Código procura demagogicamente consertar
a erronia, ao proclamar que os honorários passam a ser devidos se a parte conquistar
condições (exemplo, ganhar na mega-sena).
Pelo menos os honorários, ainda que parcimoniosos, deveriam ser pagos pelo derrota-
do - em especial os aventureiros - de modo incondicional. O País ganharia em seriedade
do cidadão frente a suas instituições e desafogaria o Estado-Juiz.  Cremos que se pre-
judicou a razoabilidade e outros princípios constitucionais, que o Conselho Federal da
Ordem poderia submeter ao escrutínio de inconstitucionalidade do STF, em seara de
controle concentrado de efeitos "erga omnes".
Outra derrapagem do sistema está no § 3º do art. 99, ao dispor que se presume ver-
dadeira a assertiva - portanto pode ser admitida sem provas corroboradoras - quando
produzida por pessoa física. Ainda que essa presunção possa ser demolida pelo juiz ou
pelo adverso (presunção "juris tantum" e não "jure et de jure", que admite prova em
contrário). Basta exemplificar: uma senhorita, filha de um grande magnata, que vive a
cortar os mares num iate, tem a seu favor a presunção de pobreza, e o adversário não
consegue fazer prova em contrário, quando o disfarce teatral é digno de uma peça
shakespeariana.
Também esta norma deveria ser levada ao STF. Creio que este seria unânime, no acatar
a arguição. Fica a palavra com nosso presidente Nacional ou, ainda, com o sr. procura-
dor Geral da República.
Não se trata de crítica ofensiva. Todo escrito grande e grandioso, como a Bíblia e o Códi-
go, ficam sujeitos a críticas do pobre homem sobre os quais tem a pretensão de recair.
Por Amadeu Roberto Garrido de Paula,
advogado especialita em Direito do
Trabalho e Direito Constitucional
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