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oma recente repercussãopositivade iniciativas de
telemedicina como as Teleconsultorias prestadas
noSistemaÚnicodeSaúdeemparceria comaUni-
versidade Federal do Rio Grande do Sul, chamada de Te-
lessaúdeRS, surge a necessidade de uma reflexão sobre
a responsabilidade dos profissionais que atuamneste ce-
nário.
Em normativa já antiga (Resolução n. 1.643/2002) o CFM
define que a telemedicina deve ter por objetivo “assis-
tência, educação e pesquisa em Saúde”, afirmando que
“o médico que exerce a Medicina a distância, sem ver o
paciente, deveavaliar cuidadosamentea informaçãoque
recebe, só pode emitir opiniões e recomendações ou to-
mar decisõesmédicas seaqualidadeda informação rece-
bida for suficienteepertinenteparaocernedaquestão”.
Na mesma resolução, se aponta que “A responsabilidade profissional do atendimento cabe ao
médico assistente do paciente. Os demais envolvidos responderão solidariamente na propor-
ção em que contribuírem por eventual dano ao mesmo. ” – ou seja, o responsável primário é
aquele que está como paciente, utilizando o serviço de teleconsultoria.
Além desta Resolução, há a Declaração de TelAviv sobre responsabilidades e normas éticas na
utilização da telemedicina, subscrita pelo CFM, que afirma claramente que “o médico é legal-
mente responsável por suas decisões”, e que ao “utilizar a Telemedicina diretamente com o
paciente, o médico assume a responsabilidade do caso em questão. Isto inclui o diagnóstico,
opinião, tratamento e intervenções médicas diretas”.
É importante ter emmente que a profissão médica não trabalha com promessa de êxito (à ex-
ceção de discussões de pontos como a cirurgia plástica), sendo o insucesso parte integrante da
ARTIGO
A responsabilização do
profissional à luz da
telemedicina
* Por Maria Luiza Gorga, doutoranda
em Direito Penal pela Universidade
São Paulo e integrante da Comissão de
Direito Médico da OAB/SP
atividade. Desta forma, se tutelaapenas aquelas condutasque fujamaoparâmetroesperadode
umprofissional diligente e atualizado na ciênciamédica.
Partindoparauma análisemais específica, a responsabilidadedomédiconoâmbitopenal segue
os aspectos do ordenamento para os indivíduos em geral, apresentando, contudo, particulari-
dades que foram incluídas pelo legislador devido à noçãode que este possui umdevermaior de
atuar em conformidade com as normas e emestrita obediência aos deveres gerais de cuidado.
Assim, a responsabilização exsurge do descumprimento de tais deveres, emconduta que confi-
gure umdos tipos penais de nossas leis.
A seu lado, a responsabilização civil depende não de uma tipicidade definida, mas apenas da
comprovação de umnexo de causalidade, ou seja, umvínculo entre o resultado e a conduta do
médico, bem como da ocorrência de algum efetivo prejuízo à pessoa, seja ele material, moral,
ou ambos.
Ainda, também pode haver a responsabilização ético-disciplinar, nos mesmos moldes do que
ocorre fora do âmbito da telemedicina, emcaso de violação de normas éticas da profissão.
Passando à questão da confidencialidade, tema também central à discussão, a Declaração de
TelAviv destaca que a “informação sobre o paciente só pode ser transmitida ao médico ou a
outro profissional de saúde se isso for permitido pelo paciente com seu consentimento escla-
recido”, sendo obrigação do profissional “assegurar que sejam aplicadas todas as normas de
medidas de segurança estabelecidas para proteger a confidencialidade do paciente”.
Dessa forma, temos que o armazenamento dos dados individuais, sobretudo aqueles de viés
médico, deve ser mantido em servidor seguro e acessível apenas ao médico responsável pela
orientação, somente naquele momento, e pelos responsáveis por sua guarda, em linha com o
art. 102 a 109 do Código de ÉticaMédica, o art. 154 do Código Penal, o art. 5º, X, da Constituição
Federal – sendo que o desrespeito ao sigilo constitui violação destes dispositivos, ensejando a
responsabilização emcada uma das esferas pertinentes.
Pelo brevemente exposto, é possível perceber que a telemedicina carrega consigo os mesmos
riscos da atividademédica tradicional, comos desafios adicionais de se proteger os dados trans-
mitidos e possibilitar ao profissional que auxilia à distância umpanorama fidedigno da situação
do paciente, de forma a permitir que sua conduta seja amais adequada ao caso – inobstante, o
profissional presenteé sempreomaior responsável, cabendoa si filtrar as recomendações rece-
bidas de acordo com seus conhecimentos damedicina e das condições e histórico do paciente.
Foto: Divulgação