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Gamil Föppel El Hireche, advogado
criminalista e doutor em Direito Penal
Econômico
Pedro Ravel Freitas Santos, advogado
criminalista e pós-graduando em
Ciências Criminais
(pela CR e, agora, pelo EOAB) tudo que tenha origem no aludido inquérito (peça investi-
gativa) deverá ser considerado nulo. Não se pode aceitar a cínica e conveniente tese de
que defeitos no bojo do procedimento investigativo são sanáveis. Ora, de nada adiantaria
o legislador positivar tais direitos, se a judicialização do caso penal tivesse o condão de
eliminar os graves atentados aos direitos fundamentais – do acusado e do defensor.
Insta salientar que o espírito da nova lei (democrático) leva a crer na acepção ampla da
expressão “assistir a seus clientes investigados”. Isso porque, a lisura e eficácia do direito
à defesa vão além do acompanhamento tão-somente do investigado. A “assistência ao
investigado” para ser real, não pode se limitar ao acompanhamento de sua oitiva.
Necessário que se permita a formulação de quesitos quando da oitiva de testemunhas e/
ou suposta vítima, que se possibilite ao causídico o acompanhamento pormenorizado do
quanto investigado. É preciso advertir aos leitores que, inacreditavelmente, ainda per-
sistem autoridades policiais (minoritariamente, registre-se que são casos esparsos) que
seguem o Direito Penal dos Estados Totalitários, e pensam que o Processo Penal ainda é
ditado pelas normas ditatoriais.
Evidentemente, a novel lei prevê como consequência ao embaraço dos direitos dos de-
fensores, a responsabilidade criminal e administrativa do responsável que dificultar ou
impedir o acesso do advogado. Cita-se o dispositivo:
“§12. A inobservância aos direitos estabelecidos no inciso XIV, o fornecimen-
to incompleto de autos ou o fornecimento de autos emque houve a retirada
de peças já incluídas no caderno investigativo implicará responsabilização
criminal e funcional por abuso de autoridade do responsável que impedir o
acesso do advogado com o intuito de prejudicar o exercício da defesa, sem
prejuízo do direito subjetivo do advogado de requerer acesso aos autos ao
juiz competente.”
Por óbvio, restarão resguardados os procedimentos sigilosos, os quais serão revelados
após apresentação de procuração. O sigilo, neste caso, é para resguardar o interesse do
investigado (relacionado, no mais das vezes, a dados relacionados à sua intimidade), ra-
zão por que a ele não pode ser oposto. Ademais, a autoridade competente poderá deli-
mitar o acesso dos advogados aos elementos referentes às diligências em andamento,
por exemplo, interceptação telefônica somente enquanto estiverem em curso. Findas, o
acesso é obrigatório, independentemente de qualquer tipo de conclusão por parte do in-
vestigador.Mais uma vez, cuida-se de norma a ser interpretada restritivamente, sob pena
de fazer letra morta às garantias aqui apresentadas.
De fato, a positivação de leis, por si só, não possui a força para a necessária mudança
político-social. Faz-se mister a mudança (estrutural e de pensamento) dos diversos atores
do Processo. A nova lei não é salvação, mesmo porque tais garantias já poderiam ser ex-
traídas de interpretação sistemática do texto de 1988. Contudo, em tempos de delações
e degradações, em tempos que se escreve que “o problema é o processo”, não deixa de
ser alentador ver o Brasil, ao menos uma vez, escolher o caminho de sua Lei Maior, ou
seja, escolher a democracia e justiça. Isso porque, não há resultado final justo, se os cami-
nhos são tortuosos e secretos.
“A lisura e eficácia do
direito à defesa vão além
do acompanhamento
tão-somente do
investigado”
ARTIGO