Revista Ações Legais - page 42-43

42
43
elementos constitutivos das sociedades modernas pós-segunda guerra mundial, que é a
capacidade de reconhecimento do outro e do diálogo. Ambas são condições para cons-
trução de processos políticos civilizacionais que permitam concordar e discordar ou criar
consensos e dissensos dentro de um ambiente de valores políticos democráticos e repu-
blicanos.
Avançando na nossa análise, a negação do outro significa a nossa própria morte como
sujeito que vive em sociedade. Como mostrou Hannah Arendt, os campos de concen-
tração foram grandes espaços de negação e de banalidade do mal orientados pelo ódio.
Não estamos afirmando a necessidade de concordar com o outro, mas de reconhecê-lo
como um sujeito discursivo – mesmo que nós discordemos totalmente dele. Aqui está a
essência da política com traços democráticos e que nos distancia de regimes autoritários
ou totalitários.
Considerando o outro e o diálogo como centrais no século 21, como devemos proceder
para controlar as notícias falsas? A resposta é mais complexa do que imaginamos. Em pri-
meiro, porque o ciberespaço organizado em escala global e de acesso difuso para parte
significativa da população mundial não tem 20 anos. Isso significa que estamos experi-
mentando novidades tecnológicas diárias numa velocidade de transmissão exponencial
em que ainda não conseguimos mensurar quais serão os impactos disso nas pessoas.
Vamos pensar quantas mensagens recebemos, lemos na íntegra, pensamos de maneira
profunda e respondemos corretamente todos os dias no Facebook, WhatsApp, Twitter,
Instagram, etc. Conseguimos contabilizar enquanto estudamos e trabalhamos? Sem con-
tar as mensagens que recebemos na madrugada. Parece que ninguémmais dorme! Dessa
forma, a qualidade dos filtros sobre as notícias recebidas e compartilhadas é muito limi-
tado.
O segundo ponto, e talvez um dos mais complexos para enfrentarmos no momento, está
ligado ao funcionamento dos algoritmos que orientam os aplicativos usados e a arquite-
tura de funcionamento das redes. Sabemos como funciona? Estamos cientes de como
e de quem define o que aparece na nossa linha do tempo do Facebook ou do Google?
Sabemos quem tem o controle? Conhecemos quais são as empresas especializadas em
criar tendências a partir de notícias falsas? A ausência de respostas efetivas e transpa-
rentes para as poucas perguntas formuladas já demonstra que os projetos de leis, como
PL 473/17, do senador Ciro Nogueira (PP/PI) e PL 6.812/17 e 7.604/17, do dep. Luiz Hauly
(PSDB/PR), que buscam regular o compartilhamento de notícias falsas pelos usuários são
limitados, insuficientes, ineficazes e até mesmo perigosos.
O perigo encontra-se no controle político que poderá ser realizado pelos órgãos públicos
e privados sem que a sociedade tenha acesso real aos mecanismos e procedimentos ado-
ARTIGO
Fake news: espaço para
o ódio e o controle da
política
A
tenção! A polícia federal confirmou hoje que
o filho do Lula era sócio da Friboi e que re-
cebeu recursos no exterior. O resultado da
investigação é determinante para inviabilizar a can-
didatura do ex-presidente. A mesma perícia nas con-
tas da empresa mostrou repasses para Aécio Neves
e Luciano Huck em conta conjunta em paraíso fiscal.
Compartilhe a notícia. Salve o país da corrupção!
Os nomes, as situações e os pedidos da mensagem
são comuns no ciberespaço e merecem nossa análi-
se. Estamos lendo uma notícia falsa (fake news) que
viraliza emsegundos pelos aplicativos dos smartpho-
nes e causam um dano político incalculável. Os com-
partilhamentos e as curtidas ganham força quando
o produtor das fake news apresenta informações
aparentemente verdadeiras, numa linguagem fácil
e destinada a um público que já tenha uma opinião
desfavorável em relação aos personagens envolvi-
dos na mentira. O fenômeno recente – que definiu
2016 como o ano que marca a era da pós-verdade
– suscita uma série de análises sobre o ambiente
virtual. No entanto, vamos nos concentrar em dois
pontos para a nossa reflexão: o discurso do ódio e o
controle da política.
O conteúdo das notícias falsas na política é caracte-
rizado pelo ódio em relação ao outro. Significa que,
majoritariamente, as fake news desprezam um dos
1...,22-23,24-25,26-27,28-29,30-31,32-33,34-35,36-37,38-39,40-41 44-45,46-47,48-49,50-51,52-53,54-55,56-57,58-59,60-61,62-63,...
Powered by FlippingBook