Revista Ações Legais - page 56-57

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ARTIGO
Garantismo constitucional
empírico
Por Wagner Dias Ferreira
O
artigo 5º da Constituição Federal, que
diz: “todos são iguais perante a lei”,
abre com um texto amplo e consolida
conquistas históricas da evolução da humani-
dade e da sociedade. Importante a distinção
destes termos, porque humanidade consegue
encampar os segmentos humanos que mes-
mo estando agrupados em locais de refugia-
dos, bolsões de pobreza, ambientes de confli-
to armado, onde a noção de sociedade como
agrupamento que visa garantir a sobrevivên-
cia e até mesmo a existência humana, não
cumprem esta função primária, e não permi-
tem a estes seres humanos usufruirem as con-
quistas da sociedade moderna.
No livro/filme “O caçador de pipas”, um ho-
mem enfrenta agruras para resgatar o irmão
no Afeganistão e lá naquela “sociedade” o
encontra sofrendo violações humanas gra-
ves. O ambiente de conflito armado afasta as
conquistas históricas da evolução humana de
prioridade absoluta e plena proteção à infân-
cia e permite o abuso. Este recrudescimento
geral do comportamento humano afeta tam-
bém o Brasil na experiência de processos ju-
diciais que crescem no sentido de interpretar
restritivamente os direitos e garantias consti-
tucionais.
Toda lei se propõe a ser um dever ser geral e
permanente, onde sua interpretação, atenta
à dinâmica de mudanças da realidade, da humanidade e da sociedade, deve ampliar seu
alcance, no caso das normas constitucionais, de modo garantista. Assim o que se espera
do poder judiciário é que suas decisões tragam esta ampliação interpretativa, garantindo
a aplicação da CF em todas as esferas da existência humana dentro do país.
Com o recente pedido de investigação contra políticos apontados na operação “Lava
Jato” todos foram unânimes em condenar o fato de não terem antecipado o seu direito
de defesa, e proclamar que irão no curso da investigação apresentar suas defesas e assim
provar suas inocências. No entanto, não é isso que se vê nas investigações voltadas con-
tra pessoas pobres e desfavorecidas. Via de regra não existe a presença de nenhuma de-
fesa nas investigações criminais. No máximo se dá vista do inquérito a advogados particu-
lares, contratados e pagos. Que não raras vezes somente têm acesso aos procedimentos
mediante ordem judicial emitida muitas vezes por meio de mandado de segurança ou
habeas corpus.
Se a pessoa é pobre e precisa de assistência da defensoria pública, não lhe é garantido
o advogado nas investigações. E o texto constitucional diz “contraditório, ampla defesa
com todos os meios a ela inerentes”. Todos os meios quer dizer inclusive os meios técni-
cos da presença do advogado. Se um investigado pedir um defensor público na delegacia,
porque é pobre, será alvo de chacota policial desatenta ao texto constitucional. Porém, a
prova de que esta é uma interpretação que deve crescer e incorporar-se ao cotidiano dos
inquéritos policiais é a uníssona declaração daqueles apontados na “Lava Jato” de que
irão se defender na investigação.
Por isso o Estado deve agir e garantir a presença dos defensores públicos nas investiga-
ções policiais para continuar a dar vida à CF expandindo suas garantias e fazendopreservar
no país o humanismo e a percepção de uma sociedade como mecanismo de preservação
e garantia da existência humana. Ressalte-se que este é apenas um viés do garantismo
constitucional, que a experiência profissional do advogado conduz a uma percepção em-
pírica do fenômeno e assim ao recorte do tema abordado.
Wagner Dias Ferreira, advogado e Membro da
Comissão de Direitos Humanos da OAB/MG
Divulgação
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