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O tempo da reforma trabalhista
nos contratos de trabalho e nas
relações coletivas
A
Reforma Trabalhista da Lei nº 13.467/17 completa
seusegundoano(dia 11denovembro). Talveznão
de vigência completa em razão da Medida Provi-
sória nº 808, editada em 14 de novembro domesmo ano
e com perda de vigência em 24 de abril de 2018. Depois
veio a Medida Provisória nº 881/2019, tratando da Liber-
dade Econômica, comalgumas alterações da Reforma e,
ao final, foi aprovada e sancionada, convertendo-se na
Lei nº 13.874/19, chamada “reforminha”.
Foram dois anos de expectativas, incertezas e de insegurança nas relações individuais e coleti-
vas do trabalho. Alguns caminharam para o “pode tudo” e outros para o “não pode nada”. Os
mais cautelosos ainda aguardam as discussões acalmarem após juristas, juízes e ministros se
manifestarem sobre conjecturas que consideram a mudança e a transformação do velho (CLT)
para o novo (CLT reformada).
O confronto do Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 (CLT) com as novas disposições da
Reforma obrigou o intérprete, necessariamente, no nosso sentir, a dois aspectos transforma-
dores: (i) à revisãodos efeitos damanifestaçãoda vontade e da responsabilidade domodelode
protecionismo paternalista e (ii) de um sindicalismomonopolista.
A revisão dos efeitos da manifestação da vontade e da responsabilidade aplicadas, comparati-
vamente ao período anterior à reforma, deveria considerar o contrato de trabalho mais próxi-
mo dos contratos de natureza civil pura, emque o ajustado faz lei entre as partes contratantes.
Contudo, a justificativa histórica (e que ultrapassa os tempos para que nas relações trabalhistas
se encontre um componente diferenciado da lei civil) justificou-se pela necessidade de empre-
go e desigualdade econômica entre as partes, alémdo que cuida a relação de força de trabalho
humano, incompatível de ser tratado como coisa e, portanto o direito civil não lhe servia e de-
monstrou seus efeitos danosos na relação de trabalho. A proteção encravada pelo direito do
trabalho, na garantia de direitos mínimos, parece justificar a existência de uma legislação espe-
cífica e fora do alcance dos princípios civilistas.
A Reforma Trabalhista contrariou a tradição e, em alguns casos, a realidade ainda existente.
Assim, aumentou o grau damanifestação da autonomia da vontade individual, como exemplo,
no disposto pelo artigo 444, parágrafo único, tratando como diferenciados trabalhadores com
salários acima do dobro do teto da previdência e que tenhamnível de ensino superior. Aomes-
mo tempo, a Reforma enfrenta temas que pareciam essenciais no contrato de trabalho e que
gozavam de indisponibilidade de direitos e garantias legais e convencionais. Aqui, a responsa-
bilidade contratual prevalecerá e não será submetida a revisões judiciais em período posterior
ao rompimento contratual dado que homenageia a prevalência do negociado, aplicando-se a
regra “rebus sic stantibus”. O preenchimento dos dois requisitos parece, todavia, pertencer a
um grupo reduzido de trabalhadores. Para os demais, aplicam-se os princípios históricos e que
justificarame que ainda podem justificar a garantia contratual mínima de direitos.
O segundo aspecto, que diz respeito à forma pela qual os trabalhadores se organizamemsindi-
catos para negociar novas condições de trabalho, fez destacar que a proteção social coletiva de
grupos identificados por vínculos de interesses comuns seria capaz de equilibrar e evoluir nas
conquistas e avanços demelhoria da condição social (art. 7º caput da Constituição Federal).
A Reforma Trabalhista, no tema direito coletivo nele compreendido a organização sindical, en-
frentou dificuldades. Não se pretende cair em lugar comum, de reconhecimento quase unâni-
me, mas vale lembrar a fragilidade de nosso sindicalismo (com poucas exceções) acostumado
nomodelo de receita certa (contribuição sindical compulsória) e de pouca prestação de contas
aos representados. Deste modo, a alteração da forma de custeio com a transferência para a
manifestação favorável do trabalhador ou empresa não sofreu resistência porque faltaram jus-
tificativas para sua permanência.
Assim, nesta continuidade de prática da Reforma Trabalhista no âmbito das relações coletivas,
a evolução ainda está a caminho porque as negociações, contrariamente ao que foramno pas-
sado, emque se negociavamos prejuízos, devempautar condições de responsabilidade para o
futuro e, emespecial, de forma consistente e programática, abandonando o aqui e agora. A au-
tonomia da vontade coletiva foi prestigiada e impõe aos negociadores (patrões e empregados)
responsabilidade de seus efeitos. Os sindicatos devem entregar para seus representados um
plano para o futuro, acompanhando as transformações do mundo do trabalho e que não seja
exclusivamente imediatista.
Tambémas negociações coletivas, compreendidos sindicato profissional e patronal, devemob-
servar a Convenção Internacional nº 98, da OIT, em seu artigo 4º, ratificada pelo Brasil em 1949,
no sentido de que o objetivo da negociação é o de regular, os termos e condições de empre-
go. Neste passo, constata-se avanço desordenado e desgovernado na fixação de contribuições
sindicais ou, nomesmo sentido, de excluir de obrigação de quota de deficientes empresas que
sejam associadas ao sindicato patronal. Todas violando a garantia de exercício do direito de li-
berdade sindical e, da quota de deficientes, a própria lei.
Mas, os erros eacertosdevemser atribuídos àpouca familiaridadecomonovo. Otempodeverá
acomodar a Reforma cuja aplicação é inexorável e são prematuras interpretações futurísticas.
Por Paulo Sergio João,advogado e
professor da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo e da Fundação
Getúlio Vargas