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ARTIGO
Judicialização na saúde
suplementar
Por Pedro Ramos - Foto: Divulgação
Pedro Ramos é diretor da Associação
Brasileira de Planos de Saúde (Abramge)
A
economia é a ciência que trata do geren-
ciamento de recursos finitos. Sendo assim,
a sustentabilidade só é possível quando há
compromisso entre os envolvidos, para que não
haja escassez de tais recursos. A lógica dos planos
de saúde é a mesma. De acordo com o mutualismo,
os mais jovens pagam para os mais velhos e neces-
sitados terem acesso à saúde suplementar. Porém,
um elo importante tem sido constantemente des-
respeitado. Conforme dados do Conselho Nacional
de Justiça (CNJ) o setor sofre um intenso processo
de judicialização. Somente entre 2011 e 2014 houve
um crescimento de 60% no número de ações em trâ-
mite nos tribunais, totalizando mais de 400 mil pedi-
dos judiciais no período.
É inegável que todo cidadão deve requerer seus di-
reitos, inclusive acesso ao melhor atendimento pos-
sível. É evidente, também, que esta interação deva
acontecer dentro das devidas normas. As operado-
ras de saúde suplementar devem, além de cumprir
as especificidades previstas em contrato, realizar a
assistência de todos os itens previstos no rol de pro-
cedimentos e eventos da Agência Nacional de Saú-
de Suplementar (ANS).
Afora isto, o atendimento é realizado pelo Sistema
Universal de Saúde – SUS.
Epor que, então, a judicializaçãodesenfreada continua
a atingir o setor privado de saúde comprometendo
aindamais os recursos advindos de seus beneficiários?
A verdade é que, além de brechas legais, as operadoras de saúde são regulamentadas por
uma legislação em constantemudança, o que dificulta sua operação. Alémdisso, ações na
Justiça devem ser o recurso extremo na hora de fazer valer os direitos dos cidadãos. No
entanto, o que vemos acontecer é justamente o contrário: são comuns situações onde o
paciente já sai do consultório médico com a receita e o cartão do advogado que vai “aviá-
-la” no judiciário.
E por que este cenário é prejudicial ao mercado como um todo? Os recursos dos planos
de saúde são finitos e, no caso da saúde suplementar, quem os provê é o próprio benefici-
ário. E quando há qualquer custo adicional, como por exemplo, para suprir o alto número
de ações judiciais, o mesmo é repassado. Isso significa que, quanto maior a judicialização,
mais caros ficam os planos de saúde. Mas o problema vai além da questão financeira: a
“farra” judicial ainda enseja fraudes, como as apresentadas pela chamada máfia das pró-
teses – assunto ainda discutido em CPI no Senado.
Este cenário não é interessante para ninguém: nem para clientes, que têm que pagar
cada vez mais, e nem para as operadoras, que perderam no último ano cerca de 800 mil
beneficiários por não conseguirem arcar com os preços praticados. Na saúde pública, a
conta também vem salgada: apenas entre 2009 e 2014 houve um aumento de 491% no
número de ações judiciais contra a União. Somente em 2015 a previsão era de esse custo
atingir a marca de R$ 1,2 bilhão.
A judicialização é, portanto, um fenômeno a ser superado. Em seu lugar, a sociedade
deve estabelecer as bases para o aperfeiçoamento institucional que garanta o direito do
cidadão à saúde e assegure, ao mesmo tempo, a sustentabilidade da assistência à saúde,
pública e suplementar.