Revista Ações Legais - page 70-71

70
71
ARTIGO
Proposta de emenda
constitucional agride a
legislação ambiental
Por Reinaldo Dias professor da
Universidade Presbiteriana Mackenzie,
doutor em Ciências Sociais e
especialista em Ciências Ambientais
N
o último dia 27 de abril, a Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ) do Senado
aprovou Proposta de Emenda Constitucio-
nal (PRC), de n. 65/2012, que modifica a legislação
ambiental. Agora a proposta será encaminhada
ao plenário para deliberação.
A proposta é um texto simples em seu enunciado
afirmando que o artigo 225 da Constituição passa
a vigorar acrescido do seguinte parágrafo 7º. “A
apresentação do estudo prévio de impacto am-
biental importa autorização para a execução da
obra, que não poderá ser suspensa ou cancelada
pelas mesmas razões a não ser em face de fato
superveniente”.
Na realidade sua simplicidade oculta uma grave
agressão à legislação ambiental, pois torna irrele-
vante a exigência de licenciamento ambiental para obras. A partir da apresentação
do Estudo de Impacto Ambiental (EIA), nenhuma obra – pública ou privada – objeto
de licenciamento ambiental poderá ser interrompida.
O licenciamento ambiental é um dos pilares da legislação ambiental brasileira. Qual-
quer obra para estabelecer sua viabilidade deve apresentar o EIA e cumprir os três
passos do licenciamento ambiental. Primeiramente solicitar a licença prévia ambien-
tal e somente após a aprovação desta se pede a licença de instalação, que permitirá
que se inicie o empreendimento. Na última etapa, caso sejam cumpridos os ajustes
indicados pelo órgão ambiental, é fornecida a licença de operação que autoriza o
funcionamento do empreendimento. A PEC 65, na prática, ignora essas fases do li-
cenciamento.
Aproveitando-se do atual momento de crise que vive o país, os defensores da PEC
se aproveitam do caos político institucional para, discretamente, acelerarem a tra-
mitação da proposta. Tendo sido apresentada em 2012, foi somente no final de 2015
que voltou a tramitar com rapidez.
Caso seja aprovada, a medida impedirá a análise de todo processo de licenciamento
com a consequente dificuldade na identificação dos impactos negativos dos empre-
endimentos tanto nos níveis federal quanto estadual.
Um dos principais argumentos dos defensores da PEC é que a proposta garante
maior agilidade e consequente economia de recursos em obras sujeitas ao licencia-
mento ambiental. Ocorre que a solução do problema de maior celeridade não está
na eliminação de mecanismos que garantem uma relação mais sustentável entre
economia e meio ambiente, mas em tornar mais eficaz e eficiente a máquina públi-
ca. O problema está na melhoria da gestão pública ambiental com foco na melhor
articulação entre o econômico, o social e o ambiental.
A legislação é cautelosa, como deve ser, pois envolve a liberação da instalação de
empreendimentos em locais que certamente serão afetados pela obra, tanto do
ponto de vista social quanto ambiental. Os processos naturais que formaram e man-
tém o ecossistema local que será afetado ocorreram durante muitos anos. Em al-
guns casos contam-se aos milhares ou milhões de anos para se consolidar e entrar
em equilíbrio, que pode ser alterado bruscamente pela intervenção humana. Desse
modo toda cautela é pouca.
O processo de licenciamento, na maioria dos casos não é lento, é cauteloso, pois a
avaliação de impacto ambiental envolve inúmeras variáveis e profissionais de diver-
sas áreas que devem sugerir medidas mitigadoras para diminuir os efeitos da obra
sobre o meio ambiente.
O cenário futuro numa eventual aprovação da PEC 65/2012 é de aumento da agressão
aos ecossistemas mais sensíveis, aumento do desmatamento, destruição de habitats,
deslocamento de populações que dependem diretamente de recursos naturais e que
se encontram no entorno do empreendimento entre outros prejuízos e retrocessos.
Esse quadro indica a necessidade da sociedade se mobilizar para barrar o avanço da
PEC 65/2012 no Senado. Lembremos do famoso poema que começa assim: “Na pri-
meira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos
nada”. E continua o poeta mostrando que temos que barrar ideias retrógradas em
seu início. Nesse caso, vamos impedir que a proposta prospere. Nenhuma flor será
roubada.
1...,50-51,52-53,54-55,56-57,58-59,60-61,62-63,64-65,66-67,68-69 72-73,74-75,76-77,78-79,80-81,82-83,84-85,86-87,88-89,90-91,...128
Powered by FlippingBook