Revista Ações Legais - page 78-79

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ARTIGO
A destinação do lucro nas
Sociedades Anônimas
Por Natália Zanelatto, advogada,
graduada em direito pela UFPR e
especializada em direito empresarial
internacional pela Universidade
Panthéon-Assas (Paris II)
O
tema sob enfoque adquire especial relevân-
cia nesta época do ano, em que a maioria das
companhias convoca suas assembleias gerais
ordinárias para deliberar sobre a destinação do lucro
líquido do exercício. Trata-se do momento de decidir
se os lucros serão distribuídos a título de dividendos,
a fim de satisfazer o interesse principal dos acionistas
que investiram na empresa, ou se serão reaplicados
na atividade econômica, de forma a permitir a sua
continuidade. Vê-se aflorar em algumas companhias,
portanto, o conflito de interesses entre os potenciais
destinatários do lucro social.
Neste cenário, destaca-se a regra de ouro das compa-
nhias, literalmente, na medida em que foi criada para
estimular o investimento na livre iniciativa: o lucro
do exercício deve ser integralmente distribuído aos
acionistas. Essa norma comporta exceções, mas é im-
portante tê-la emmente de modo a evitar desvios de
interpretação das disposições legais e estatutárias.
A companhia foi constituída pelos acionistas para o
exercício de uma atividade econômica, visando especialmente o lucro. É natural, portan-
to, que eles sejam os destinatários por excelência dos frutos de seu investimento.
Além dessa disposição, há outra que atribui aos acionistas o poder de deliberar sobre a
destinação do lucro. Estes, destinatários por regra do resultado positivo do exercício,
poderão renunciar à parte ou à totalidade deste em favor da companhia. No entanto, as
situações que autorizam a não distribuição do lucro aos acionistas são limitadas e regula-
das por lei (numerus clausus), de forma a evitar desvirtuamento da companhia.
De olho nessas premissas, enumeram-se as exceções à distribuição do lucro:
• Reserva Legal:
a despeito da companhia ter por fim a geração de lucro aos acio-
nistas, não é essa a sua única função. A sociedade como um todo se beneficia do
exercício da sua atividade econômica e existência – empregados, Fisco, fornecedo-
res, clientes/consumidores, instituições financeiras, entre outros. É nesse contex-
to que se insere a reserva legal, instituída pela Lei das Sociedades Anônimas para
garantir a integridade do capital social, isto é, que ele seja retido na companhia
e efetivamente represente medida da solvabilidade desta. Assim, a lei obriga os
acionistas a reaplicarem 5% do lucro líquido do exercício na constituição de referida
reserva, que não excederá 20% do capital social.
• Reserva Estatutária:
os acionistas podem instituir no Estatuto Social reservas de
lucros, desde que seja indicado de modo preciso e completo a sua finalidade, a par-
cela dos lucros anuais que serão destinados à sua constituição e o limite máximo
da reserva.
• Reserva para Contingências:
a distribuição de dividendos não deve ser feita de
forma irresponsável, ignorando situações que implicarão perda provável da com-
panhia em exercício social futuro. Assim, a administração poderá propor a consti-
tuição de reserva para contingências e indicar a causa dessa perda. Uma vez supe-
radas as razões que justificaram a sua constituição, a reserva deverá ser distribuída
aos acionistas.
• Reserva de Incentivos Fiscais:
a lei autoriza que a parcela do lucro líquido decor-
rente de doações ou subvenções governamentais para investimentos seja desti-
nada à reserva de incentivos fiscais. Portanto, está excluída da base de cálculo do
dividendo obrigatório, conforme orientação dos órgãos da administração.
• Retenção de Lucros:
os acionistas podem deliberar reter parcela do lucro líquido
do exercício prevista em orçamento de capital por ela previamente aprovado. O
referido orçamento apresentado pela administração deve conter a justificativa da
retenção de lucros e poderá ter a duração de até cinco anos, exceto se houver pro-
jeto de investimento da companhia com maior duração.
• Reserva de Lucros a realizar:
trata-se de reserva a ser constituída quando a empre-
sa não possui situação financeira que suporte o pagamento integral dos dividen-
dos obrigatórios. Ou seja, há lucro contábil, porémnão há previsão de recebimento
dos valores em espécie no curto prazo. Tem-se uma reserva cujos lucros, quando
realizados, devem ser destinados ao pagamento do dividendo mínimo obrigatório.
As reservas e retenções, além das regras acima estabelecidas, deverão atender a outros
critérios para constituição. A reserva estatutária e as retenções, por exemplo, não pode-
rão ser criadas em prejuízo da distribuição do dividendo mínimo obrigatório. Além disso,
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