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Dentre as condições-base para que um Estado integre o Mercosul estão a incorporação
solidaria pelos Estados em sua legislação de acordos comuns sobre as mais diversas te-
máticas, desde normas sobre cooperação técnica, passando por acordos sobre entrada
e residência em seu território de nacionais dos outros Estados-parte. Além do déficit de
ação coordenada na incorporação de acordos que abrangem as mais diversas searas, a
cessação do exercício dos direitos da Venezuela inerentes à condição de Estado-parte do
Mercosul tem estreita relação com a função fiduciária de proteção dos Direitos Humanos
desempenhada pelo Direito Internacional.
Longe estão os tempos em que a soberania estatal era princípio inegociável. A partir
de meados do século XX, sob a sombra das atrocidades cometidas durante a Segunda
Guerra Mundial e desde então, o Direito Internacional promove a proteção dos Direitos
Humanos de forma universal. A comunidade internacional passa a encorajar a atuação
solidária dos Estados pela proteção dos Direitos Humanos e atua subsidiariamente em
prol desta mesma proteção. Dentre os acordos não incorporados pela Venezuela ao
seu ordenamento jurídico interno está o Protocolo de Assunção sobre o Compromisso
com a Proteção e Promoção dos Direitos Humanos do Mercosul. O Protocolo, ao enun-
ciar o compromisso dos Estados-parte do Mercosul entre si e perante suas comunida-
des nacionais, considera fundamental assegurar a proteção, promoção e garantia dos
Direitos Humanos e liberdades fundamentais de todas as pessoas. Asseverando ainda
que o usufruto efetivo dos direitos fundamentais é condição indispensável para o pro-
cesso de integração entre os Estados.
A cessação de direitos inerentes a condição de Estado-parte em uma Organização In-
ternacional é uma sanção aplicada com o objetivo de encorajar o Estado a reavaliar sua
posição em todas as frentes. A iniciativa reforça a compreensão de que hoje a harmoni-
zação de normas técnicas não são as únicas condições para a fruição dos benefícios de
pertencimento a um bloco que há muito deixou de ter o mero objetivo de cooperação
econômica. A proteção dos Direitos Humanos, assim como o cumprimento das normas
comuns sobre circulação de pessoas, são condições indispensáveis para o efetivo pro-
cesso de integração.
Por Melissa Martins Casagrande, doutora
em Direitos Humanos e Pluralismo
Jurídico e professora de Direitos
Humanos e Direito Internacional Público
na Universidade Positivo