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o Instituto Patrícia Galvão, estudo com meninas e jovens de 14 a 24 anos, das classes C, D e E.
Os dados obtidos revelaram que 77% das meninas acreditam que o machismo impacta seu de-
senvolvimento e 90% responderamque deixaramde fazer alguma coisa por medo da violência,
como usar determinadas roupas ou frequentar espaços públicos.
OBrasil assumiu compromissos internacionais para eliminar e prevenir a violência contra asmu-
lheres de qualquer idade. Cito o compromisso para a redução da taxa de abandono feminino
dos estudos eaorganizaçãodeprogramas paraaquelas jovens emulheres que tenhamdeixado
os estudos prematuramente; e também o de assegurar o direito de a mulher ser valorizada e
educada livre de padrões estereotipados de comportamento e costumes sociais e culturais ba-
seados emconceitos de inferioridade ou subordinação.
O artigo 8º da Lei Maria da Penha garante a inclusão da perspectiva de gênero na educação. O
Brasil assumiu esse dever, reconhecendo a necessidade de uma educação que prima pela igual-
dade de gênero.
Simples assim. Só que não.
Aquelas meninas que nasceram em 2006, ano em que a Lei 11.340 foi publicada e iniciou vigên-
cia, hoje tem onze anos de idade. Quantas delas no Brasil tem a garantia de uma educação fe-
minista? Ainda crescem sob desigualdade de gênero, vulneráveis a uma série de violências que
permeiam por todos os espaços, públicos e privados, como em casa, nas ruas, nos transportes
públicos e privados e ainda carecem de representatividade e participação nos mais variados
espaços de liderança.
Algumas iniciativas sugerem uma série de ações voltadas às jovens, as quais são importantes
instrumentos de igualdade degênero e prevenção da violência contra amulher.
Dentre as recomendações da Plan International na pesquisa já citada “Por ser menina”, além
de campanhas e ações que possam incidir sobre o lugar das meninas no imaginário social e que
possam levar os órgãos públicos responsáveis por políticas sociais para crianças e adolescentes
a adotarem recortes de gênero, visando à diferenciação nas metas e estratégias dessa política,
está a realização de ações demobilização social das próprias meninas, incluindo a conscientiza-
ção de seus responsáveis, famílias, lideranças e escolas, visando a seu empoderamento e prota-
gonismo social.
AmesmaPlan International apresentauma sériede iniciativas quepromovemoempoderamen-
to de meninas, desde a consciência de que o trabalho não é brincadeira, até educação sexual,
capacitação profissional, oficinas de lideranças, dentre outros.
A também já citada pesquisa #meninapodetudo, aponta algumas atividades pioneiras, como a
“Respectful Relationships” da Austrália, um plano nacional para trabalhar a violência contra a
mulher dentrodas escolas como formadepolíticapública, cuja cartilha apresentaumabase teó-
rica sobre feminismo para que os professores utilizemo tema de forma transversal no currículo
escolar.
A agência “Between Friends” de Chicago promove grupos de discussão e oficinas em sala de
aula para opúblico adolescente voltados à compreensãode como construir emanter relaciona-
mentos saudáveis, sobre namoro, violência e como preveni-la em suas próprias vidas, além de
envolver-se emesforços de educação e prevenção com seus pares, escolas e na comunidade.
Outro programa realizado pela organização “Love is respect”, cujo objetivo é envolver, educar
e capacitar jovens para prevenir e acabar com relacionamentos abusivos, é composto por ad-
vogados treinados que oferecem apoio, informação e consultoria para quem tem dúvidas ou
preocupações sobre seus relacionamentos de namoro, através de ambiente virtual.
A plataforma digital da Planned Parenthood oferece, dentre outros, material de educação se-
xual para jovens, abordando temas como a puberdade, sexo, prevenção de gravidez, relaciona-
mentos, privacidade online, etc. EmSevilha, na Espanha, uma das suas principais linhas de ação
em igualdade de gênero foi o desenvolvimento de uma proposta de formação para o ambiente
escolar, primando pela consciência de gênero e prevenção da violência contra a mulher, focan-
do alunos, professores e comunidade.
Vale citar também o rico material disponibilizado pela ONUMulheres Brasil a respeito da inicia-
tiva “O Valente não é Violento”, promovida dentro da campanha UNA-SE Pelo Fimda Violência
Contra as Mulheres, cujo objetivo é o de estimular a mudança de atitudes e comportamentos
dos homens, enfatizando a responsabilidade que devem assumir na eliminação da violência
contra as mulheres emeninas.
São muitos os exemplos de iniciativas da sociedade civil capazes de contribuir para as políticas
públicas brasileiras e permitir que o primado da igualdade de gênero seja um instrumento pra-
ticado da não violência contra a mulher. Bastam adotar, nossos Municípios, Estados e União,
dentro de suas esferas de competências, tais iniciativas, ou mesmo suas próprias em nome do
primado da garantia da observância dos direitos humanos.
Assim, para que seja fechada a rota crítica da intolerância e da discriminação de gênero, classe
e raça que a maior parte da população enfrenta hoje é necessária uma educação que as torne
superpoderosas desde cedo,muito cedo. Desta forma será possível, frente ao seupapel natural
deeducadoranatural dos filhos, formar gerações depessoas sema inserçãodepreconceitos de
qualquer tipo. Para que a mulher seja dona de si, livre de violência e valorizada por ser mulher,
ela precisa ter convicção de quemninguém fará isso por ela. A atitude nos pertence.
Por Fabíola Sucasas, promotora de
Justiça
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