Revista Ações Legais - page 88-89

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Nesta mesma linha Marçal Justen Filho destaca que "é evidente o vínculo indissociável
entre saneamento básico e direitos fundamentais".
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Esta ampla relação entre os princípios da universalização dos serviços de água e esgoto e
o princípio da dignidade humana é que, seguindo a premissa de José Joaquim Gomes Ca-
notilho
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de que o ser humano é o fundamento e o limite da República, obriga o Estado a
estabelecer políticas públicas voltadas para o atendimento da população, especialmente
para os mais carentes.
Devem ser seguidas as diretrizes internacionais que declararam a água limpa e segura e
o saneamento como um direito humano essencial para gozar plenamente a vida e todos
os outros direitos humanos, consoante Resolução A/RES/64/292 da Assembleia Geral das
Nações Unidas, de 28 de julho 2010.
Logo, o acesso à água de qualidade e ao saneamento (leia-se esgotamento sanitário) é
um direito humano, cujo acesso está relacionado à dignidade humana, motivo pelo qual
o Poder Público deve buscar o atendimento universal com tarifas módicas e que possibi-
litem o acesso a bem essencial, mesmo que escasso.
2 - HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO DE SANEAMENTO BÁSICO E O PAPEL DO
"SUBSÍDIO CRUZADO"
Desde a implementação do Plano Nacional de Saneamento (PLANASA) pelo Decreto-Lei
nº 949, de 13 de outubro de 1969 (executado pelo Banco Nacional da Habitação - BNH a
partir de 1971), optou-se pela política de "subsídios cruzados" para o setor, conforme se
pode verificar na política tarifária instituída pela Lei nº 6.528, de 11 de maio de 1978 e De-
creto nº 82.587, de 7 de novembro de 1978.
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Este primeiro marco legal do setor vigorou até o ano de 2007, quando, depois de ampla
discussão política, foram reunidos o Projeto de Lei nº 5.296/2005, de iniciativa do governo
na Câmara e o projeto substitutivo do relator Julio Lopes (PP/RJ), PLS nº 219/2006, dando
5
JUSTEN FILHO, Marçal. Parecer sobre a minuta do Projeto de Lei nº 5296/2005: diretrizes
para os serviços públicos de saneamento básico e política nacional de saneamento básico - PNS. cit.,
p. 208.
6
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed.
4ª reimpressão. Coimbra: Almedina, 2003, p. 225.
7
Art. 11 - As tarifas deverão ser diferenciadas segundo as categorias de usuários e faixas de
consumo, assegurando-se o subsídio dos usuários de maior para os de menor poder aquisitivo, assim
como dos grandes para os pequenos consumidores. (BRASIL, Planalto Central. Decreto 82.587, de 6
de novembro de 1978: Regulamenta a Lei nº 6.528, de 11 de maio de 1978, que dispõe sobre as tarifas
dos serviços públicos de saneamento e dá outras providências. Disponível em: <
-
to.gov.br/ccivil_03/decreto/D82587.htm>. Acesso em: 29 mar. 2019).
origem ao PL nº 7.361/2006, que foi aprovado em dezembro de 2006 e sancionado como
a Lei nº 11.445, em 5 de janeiro de 2007 (Marco Regulatório do Setor de Saneamento).
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Esta legislação que fixa as diretrizes nacionais para o saneamento continua lançando mão
da política de subsídios com a adoção de tarifas diferenciadas e subsídios, especialmente
para atender aos mais carentes.
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Tal previsão consta da legislação, no art. 29 e 31 da lei
11.445/2007
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, que revogou a legislação anterior.
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"Os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, Aldo Rebelo e Renan
Calheiros, instalaram nesta terça-feira (30) a comissão mista destinada a sistematizar os projetos
de lei sobre saneamento em tramitação nas duas Casas do Congresso. Com prazo de 30 dias para
concluir seus trabalhos, a comissão será composta de seis senadores e seis deputados. Uma política
nacional de saneamento básico foi recentemente objeto de discussão na Câmara, mas os deputados
não chegaram a um acordo para a votação de um projeto. Estados e municípios brasileiros, assim
como entidades da sociedade civil, também não concordaram sobre uma política nacional de sane-
amento, discordando, sobretudo, em itens como a participação da iniciativa privada, os meios de
fiscalização, as regras e os objetivos da gestão dos serviços. [...]. A comissão mista está sendo criada
justamente para encontrar um ponto de equilíbrio entre algumas propostas de um marco regulató-
rio para o saneamento básico do país - disse. Renan lembrou que no Senado está em tramitação o
Projeto de Lei (PLS) 155/2005, de autoria do senador Gerson Camata (PMDB-ES), que é relatado pelo
senador César Borges. Outra proposta, o PL 5.296/2005, em tramitação na Câmara dos Deputados,
tem como relator o deputado Júlio Lopes e teve origem no próprio governo federal. O projeto do
Senado, disse Renan, tem o apoio dos governos estaduais. O projeto do Executivo, em tramitação
na Câmara, segundo entendimento dos secretários estaduais, rompe com o sistema atual, trazendo
um relativo centralismo federal ao propor a criação do Sistema Nacional do Saneamento (Sinasa),
e traz ‘uma dose de complexidade técnica e jurídica’, disse Renan". (BRASIL, Senado Federal. Re-
nan e Aldo instalam comissão mista de saneamento. Agência Senado, 30 mai. 2006. Disponível em:
-
-de-saneamento>. Acesso em: 28 mar. 2019.
9
"De acordo com o princípio da solidariedade, as tarifas devem ser módicas, podendo ser
diferenciadas em função do perfil de usuário. Isto permite que determinadas categorias de usuários
subsidiem outras menos abastadas. Ainda na mesma linha, também poderão ser adotados subsí-
dios tarifários e não tarifários para localidades que não tenham capacidade de pagamento ou escala
econômica suficiente para cobrir o custo integral dos serviços". (SOUTO, Marcos Juruena Villela. O
marco regulatório do saneamento básico e o poder normativo das agências reguladoras. In: GALVÃO
JUNIOR, Alceu de Castro; XIMENES, Marfisa Maria de Aguiar Ferreira (Org.). Regulação: normatiza-
ção da prestação de serviços de água e esgoto. Fortaleza: Agência Reguladora de Serviços Públicos
Delegados do Estado do Ceará – ARCE, p. 51-72, 2008, p. 55).
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Art. 29. Os serviços públicos de saneamento básico terão a sustentabilidade econômico-
-financeira assegurada, sempre que possível, mediante remuneração pela cobrança dos serviços:
I - de abastecimento de água e esgotamento sanitário: preferencialmente na forma de tarifas e ou-
tros preços públicos, que poderão ser estabelecidos para cada um dos serviços ou para ambos con-
juntamente; [...]
§ 2o Poderão ser adotados subsídios tarifários e não tarifários para os usuários e localidades que não
OPINIÃO
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