Revista Ações Legais - page 61

ARTIGO
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o inconveniente maior da Democracia – a urna – via publicidade impulsionada rapidamen-
te traz para o centro da discussão o papel das plataformas e dos ambientes de redes so-
ciais, bem como o abuso do poder econômico perpetrado por alguns.
Empresas privadas avaliadas na casa das dezenas de bilhões de dólares são donas dos
tais serviços, redes e ambientes que, hoje, drenam substancial parte do bolo publicitário,
dando portentoso retorno aos seus acionistas, e atuando sem muitas explicações a dar
sobre a qual crivo submetem toda a sorte de anúncios veiculados. Menos ainda teriam a
responder, não houvesse o Marco Civil da Internet, Lei 12.965/2014. À época de sua apro-
vação no Congresso, a grita enorme dizia mirar o Estado em interferir na atuação privada
num ambiente livre.
Mas na verdade, aprende-se, verdadeiramente livre permaneceria a rede se tutelada pelo
- sempre ele - Estado. Do contrário, imperará, como impera, a lei da selva, onde quem não
prevalece, certamente, é o mais fraco. Aqui falamos de dados, análise dos fatos já docu-
mentados, comprovação e ciência. Infelizmente, nestes tempos, buscar base científica
indica a tomada de lado, aos olhos de muitos.
Nas palavras do jornalista Sean Gallagher, a internet de hoje lembra a cidade de Nova Ior-
que dos anos 70: uma cacofonia de discursos de ódio, pequenos golpes, ondas de boatos.
Gallagher talvez não conheça o Brasil, reflito. Este bate-estaca de desinformação serve
para erodir a credibilidade das fontes mais autorizadas de dados. Emmeio à tempestade,
duvida-se de tudo, acredita-se em quase nada. No nivelamento rasteiro gerado, quem
mais tem a ganhar é justamente o propagador de notícias falsas, ou em português cor-
rente – fake news.
Muito da urgência em se regular tais serviços, posturas e ambientes vem de constata-
ções de que o cidadão comum não é apenas sujeito passivo de tais comportamentos,
mas também parte integrante do movimento. Segundo estudo do Pew Research Center,
conduzido em dezembro de 2016, na esteira da eleição presidencial americana, metade
das pessoas que entende ter compartilhado notícias falsas praticou tais atos sabendo da
ilegitimidade dos dados repassados - justamente quando as informações coincidem com
suas crenças.
A publicidade que corre nas veias das plataformas é livre e desimpedidamente ofertada
com precisão cirúrgica a todos nós com base na riqueza maior gerada e entregue a troco
de nada ou muito pouco: dados comportamentais. É a inteligência extraída deste ocea-
no de bytes, chamada de data mining, candidamente assim nominada por quem explora
o negócio, a grande arma utilizada e em utilização por detentores do poder econômico
para disseminar ondas de boatos, fake news e assassinatos de reputação. E a sociedade
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