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polêmico conhecido como "backlash", como uma espécie de reação do patriarcado à rejeição das violências”,
pontua.
A desembargadora ressalta que quando se fala em dados de violências, “tanto devemos considerar isso, como
também o fato de que as mulheres passam a romper o ciclo de violências e denunciarem os casos que as atin-
gem, ou no feminicídio a percepção de que as suas mortes ocorrem pelo fato de serem mulheres”. Segundo
Priscilla, nessa linha, os aumentos percebidos pós-edição de leis deve levar em conta essa questão multifatorial.
Priscilla explica que no que concerne à CEVID-TJPR - Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Vio-
lência Doméstica e Familiar do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, além de sua trajetória no âmbito da
Corte, a partir do quinquênio da Lei do Feminicídio, utilizou tal item (o feminicídio) como categoria de análise
da avaliação e do incremento de sua política judiciária estadual. Ou seja, a partir da análise dos casos aconte-
cidos buscaremos numa pesquisa que deve levar um ano para ser concluída compreender as necessidades e os
incrementos da atuação judiciária. “Os dados em todo o país e também no Estado associados às pesquisas das
ciências humanas, jurídicas e sociais podem contribuir para a compreensão do fenômeno, sua caracterização e
trabalhar para - não apenas a sua responsabilização - sua evitação”, conclui a desembargadora.
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Compreender o feminicídio para erradicar a violência
A advogada Sandra Lia Bazzo Barwiski argumenta que compreender as origens
culturais do feminicídio é imprescindível para uma sociedade que se predispõe
à erradicação da violência contra as mulheres. "Entendo que devem ser as con-
dições sociais, políticas e jurídicas, seu contexto cultural prático, institucional e
estrutural, que oportunizam as situações de violência específicas. De forma que
um feminicídio, por exemplo, seja percebido como resultado de um sistema am-
plo de subordinação das mulheres e não apenas como uma anomalia”..
“Não há como falar em feminicídio sem antes abordar a violência de gênero con-
tra as mulheres (que constitui discriminação contra as mulheres nos termos do
artigo 1 da Convenção CEDAW - Convention on the Elimination of All Forms
of Discrimination Against Women, tratado internacional aprovado em 1979 pela
Assembleia Geral das Nações Unidas), como um fenômeno complexo, social, his-
tórico e culturalmente construído que compromete os direitos fundamentais à
vida, à saúde, à liberdade, à dignidade humana”.
Sandra Lia destaca que são necessários instrumentos democráticos não só para
eliminar a violência e garantir a segurança, mas para assegurar a cidadania, a
inclusão e a participação das mulheres em igualdade de condições e oportunida-
des. “É obrigação dos Estados a adoção de medidas adequadas para evitar, bem
como para investigar, processar, punir e providenciar a reparação por atos ou
omissões de atores não estatais que resultem em violência de gênero contra as
mulheres" (Recomendação Geral nº 35, Comitê CEDAW).
Ao voltar os olhos para o Brasil, Sandra Lia explica que o Sistema de Justiça pre-
cisa compreender a natureza extrapenal da Lei Maria da Penha, que oportuniza
às mulheres um papel ativo no enfrentamento da violência. A Lei Maria da Penha rompe com o paradigma da
organização do exercício do poder jurisdicional, em relação à atribuição de competência das Varas e Juizados
de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, no entanto, os Tribunais de Justiça têm relutado em imple-
mentar a Lei no que concerne à competência cível e criminal.
Nessa esteira, Sandra Lia destaca que, em 2019, foi promulgada a Lei nº 13.894, que altera a Lei Maria da Penha
para prever a competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher para a ação de di-
vórcio, separação, anulação de casamento ou dissolução de união estável nos casos de violência. “Entendo que
a Lei nº 13.894, a pretexto de ampliar, reduziu a abrangência da Lei nº 11.340/2006, pois pode ter excluído a
competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher para processar e julgar os efeitos
da violência patrimonial”.
Com mais especificidade, Sandra Lia argumenta que precisamos informar as mulheres, e toda a população,
sobre direitos humanos e sobre a disponibilidade de mecanismos de acesso à justiça, com informações precisas
sobre redes de atendimento, assistência jurídica e serviços sociais. Só que para isso precisamos que esses servi-
ços estejam ativos e tenham capacidade técnica para o atendimento.
Ainda como enfrentamento do feminicídio, Sandra Lia acredita que é imprescindível, que os direitos humanos integrem os
Advogada Sandra Lia Bazzo
Barwinski
ESPECIAL